Dá sempre mau resultado. O Governo iraquiano, apoiado por
milícias xiitas, conselheiros da coligação internacional e também do Irão, está
a combater o Estado Islâmico em Mossul, mas não tem um plano para depois da
vitória anunciada. Na verdade, existe um plano do Governo de Bagdad, mas não é
um plano que garanta um futuro de paz. O Governo xiita do Iraque olha para a
Mossul sunita da mesma forma que olha para a Bassorá xiita ou para zonas em que
mantém autoridade, vendo apenas território (e recursos) que considera seu. E é
precisamente isso que os sunitas de Mossul não querem: não querem ser
governados por xiitas ou, no mínimo, mesmo sob a alçada de um Governo xiita em
Bagdad, querem ter a sua própria gente a governar uma cidade de que se
consideram legítimos donos e herdeiros.
Este tipo de abordagem meramente militar costuma sair caro:
militares no terreno para derrotar um inimigo mas sem qualquer plano político
para o futuro da área disputada, e que aconchegue os vários interesses em jogo,
degenera frequentemente em novos conflitos.
A derrota militar do Estado Islâmico em Mossul é apenas uma
questão de tempo, mas não se sabe quanto tempo. Vai demorar até chegar o dia em
que a bandeira do Iraque possa ser içada em todas as ruas da cidade. Quantas vidas vai custar é outra pergunta para
a qual não há resposta.
Os muitos milhares de homens bem equipados ao serviço do
Governo iraquiano ajudados por milícias e ataques aéreos da coligação
internacional trancaram os combatentes do Estado Islâmico na cidade. Ao que se
sabe não há rota de fuga porque a ligação à fronteira síria foi cortada. Não se
sabe ao certo quantos homens tem o Estado Islâmico e quais os recursos de que
ainda dispõe após meses de combate e a quase ausência de reabastecimento.
Peritos
militares norte-americanos citados nos órgãos de comunicação social admitem que
o Estado Islâmico não disponha de uma força superior a dois mil homens. Em
termos estratégicos, os especialistas dizem que vamos assistir a um recuo dos
combatentes do Estado Islâmico para as zonas mais habitadas da cidade e aí sim,
vai ser lutar até ao fim. Até à morte. Ruas e vielas da zona ocidental de
Mossul, com mais de meio milhão de habitantes ameaçam tornar-se num inferno.
Até agora as declarações dos responsáveis militares iraquianos vão no sentido
de evitar os bombardeamentos com artilharia pesada para poupar a vida dos
habitantes.
A fuga dos habitantes de Mossul prevista pela ONU quando a
ofensiva começou a 17 de Outubro de 2016, não teve a dimensão esperada. Desta
vez não se sabe como vai ser. Muitos dos que então não fugiram de Mossul terão
atravessado o Rio Tigre em direcção à margem ocidental onde está o último
reduto do Estado Islâmico.
O Governo do Iraque e o Governo Regional do Curdistão não
divulgam as baixas militares. A única coisa que se sabe é que o Governo
Regional do Curdistão admitiu que desde o início da ofensiva militar os
hospitais de Erbil acolheram 14 mil feridos (civis e militares).
Um sinal do que pode acontecer num futuro próximo é dado por
Atheel al Nujaifi, antigo Governador do Nínive, e de Mossul, um militar sunita
que criou a sua própria milícia e que vive em Erbil (capital do Curdistão
iraquiano) desde que o governo de Bagdad emitiu um mandado de captura contra
ele. Atheel Al Nujaifi fugiu da cidade aquando do avanço do Estado Islâmico e
acusa Bagdad de não lhe ter dado o apoio que pediu nessa altura. Al Nujaifi
considera que Mossul deve ser governada por sunitas da própria cidade e não por
gente enviada de Bagdad. Justifica dizendo que é a única forma de resistir
ideologicamente, e não apenas pela força militar, ao Estado Islâmico. Isto é:
se a cidade for governada por xiitas, a população terá tendência a apoiar os
extremistas e nova insurgência pode emergir.
Os Estados Unidos já disseram que pensam ficar após a
conquista de Mossul, mas nesse caso terão de esperar por um convite do Governo
iraquiano. Se assim for, a vontade do Irão também conta. Dos cerca de 9 mil
homens da coligação internacional de 60 países, mais de metade são
norte-americanos. Os Estados Unidos saíram do Iraque, mas voltaram em força. Só
que neste momento as coisas mudaram e a prova disso foi a forma como o novo
secretário norte-americano da defesa, Jim Mattis, se apresentou na primeira
visita a Bagdad, dizendo que os Estados Unidos não estão no Iraque por causa do
petróleo nem para o monopolizar. Para além disso há o decreto de Donald Trump a
impedir a entrada de cidadãos de sete países de maioria muçulmana, entre eles o
Iraque. A ver vamos como responde Bagdad a esta intenção norte-americana.
21 de Fevereiro de 2017
josé manuel rosendo