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sábado, 22 de julho de 2017

A certeza da dúvida


Sobre a alegada morte de Abu Bakr al Baghdadi, líder do Estado Islâmico, a única certeza é a de que há muitas dúvidas. Desde que a Rússia anunciou a morte de Abu Bakr que os Estados Unidos recusam confirmar essa informação. 

No Iraque, o porta-voz militar norte-americano disse que não tinha informação para fazer essa confirmação; mais recentemente, a 14 de Julho, foi o Secretário da Defesa, Jim Mattis, a dizer que os Estados Unidos não possuíam informação que demonstrasse a morte de Abu Bakr e que a atitude dos Estados Unidos será a de considerar que al Baghdadi está vivo, até prova em contrário; a 17 de Julho, o porta-voz do Kremlin, disse que a informação recebida é contraditória e está a ser investigada pelas agências russas; esta sexta-feira, 21 de Julho, Nicholas Rasmussen, director do Centro de Contra-Terrorismo dos Estados Unidos corroborou as afirmações anteriores dizendo que não dispõe de qualquer informação que possa confirmar a morte do líder do Estado Islâmico.

Para além do anúncio inicial feito pelo Ministério da Defesa da Rússia (16 de Junho) de que Abu Bakr tinha sido morto (a 28 de Maio) nos arredores de Raqqa (Síria), e depois pelo Irão, o que mais credibilidade mereceu – por ser uma fonte geralmente muito bem informada – foi o que teve origem no Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH). Rami Abdul Rahman, director do OSDH disse que tinha informação confirmada de um dos líderes do Estado Islâmico em Deir ez Zor (Síria) e que activistas do OSDH também obtiveram a informação de fontes do Estado Islâmico de que Abu Bakr al Baghdadi tinha sido morto e que terá sido na região de Deir ez Zor que passou os últimos três meses.

Esta informação sobre a região onde Abu Bakr terá passado os últimos meses coincide com a informação dos serviços secretos dos curdos iraquianos que acreditam na presença dos mais destacados líderes do Estado Islâmico na zona a sul de Raqqa, ou seja, muito próximo da região de Deir ez Zor. Lahur Talabany, o chefe dos serviços secretos dos curdos do Iraque (quase) não tem nenhuma dúvida de que Abu Bakr al Baghdadi está vivo. A 17 de Julho, numa entrevista à agência Reuters, disse ter a informação de que ele está vivo e “acredita a 99% que Al Baghdadi está vivo”. Lahur Talabanay lembra que Abu Bakr al Baghdadi conseguiu esconder-se durante largo tempo dos serviços secretos iraquianos (quando liderava a Al Qaeda no Iraque), tem uma longa experiência e “sabe o que está a fazer”.

A menos que a Rússia tenha alguma prova credível de que Abu Bakr al Baghdadi morreu nesse ataque aéreo de Maio, está instalada a dúvida sobre o que de facto terá acontecido ao líder do Estado Islâmico. O bombardeamento do qual terá resultado a morte de Al Baghdadi foi violentíssimo e, diz a Rússia, morreram umas largas dezenas de combatentes e comandantes do Estado Islâmico. Pode dar-se o caso de Al Baghdadi ter sido “pulverizado”, mas estamos apenas no campo das hipóteses. A Rússia tem estado em silêncio, mas é bom lembrar que os Estados Unidos dizem que mataram Bin Laden e nunca fizeram prova disso.

Pinhal Novo, 22 de Julho de 2017
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josé manuel rosendo

quinta-feira, 20 de julho de 2017

Os milhões da BBC


É frequente ouvir referências ao exemplo da BBC para se dizer como deveria ser a RTP. Até que nem seria nada mau podermos ter um serviço público de rádio e televisão com a capacidade e o potencial da BBC. Mas a realidade aconselha a que tenhamos os pés bem assentes na terra.

Vem isto a propósito da revelação feita esta quarta-feira (19 de Julho), pela própria BBC, e por imposição do Governo, dos salários das suas principais figuras e dirigentes. Ficámos a saber que Chris Evans, o animador das manhãs da rádio BBC 2, recebe por ano 2,2 milhões de libras (cerca de 2,48 milhões de euros – sim, não há erro, recebe 2,48 milhões de euros por ano). Recebe cinco vezes o que chega à conta do próprio director-geral da BBC, Tony Hall. A outra (única) pessoa do grupo BBC a receber mais de um milhão de libras por ano é o antigo futebolista Gary Lineker (recebe 1,75 milhões de libras por ano).

Dito isto, perguntar-se-á: e o dinheiro é tudo? Não, não é! E não será possível fazer bem mesmo tendo menos dinheiro? Sim, é! Mas, calma, muita calma. Porque não havendo ovos não há mesmo omelete.

E quando alguém quiser exigir à RTP algo semelhante ao que é produzido pela BBC, seja rádio ou televisão, talvez seja melhor ver como é formada e como trabalha uma equipa de reportagem da BBC, por exemplo, em zonas de conflito. Depois, podem dizer o que quiserem.

Já agora, a BBC revelou os salários de quem lá trabalha por imposição do Governo conservador. A Ministra da Cultura britânica argumentou que esta divulgação permite à BBC ficar alinhada com a exigência de transparência imposta aos serviços públicos. A transparência é sempre bem-vinda, mas num mercado como o do audiovisual em que o serviço público concorre com empresas privadas, a divulgação feita apenas favorece os privados – porque ficam com essa informação – que não estão obrigados à mesma divulgação de salários das suas vedetas. Ou seja, transparência, mas pouco. Só do lado do serviço público. Nada que se pareça com concorrência desleal, pois não?

PS – não estou a defender as “vedetas” da RTP, era o que faltava. Nem estou a queixar-me de nada. Só para que não fiquem dúvidas.

Pinhal Novo, 20 de Julho de 2017

josé manuel rosendo