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segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Loureiro dos Santos, o Homem que sabia pensar

O mais recente livro do General Loureiro dos Santos, publicado no início de 2016

Obrigado, é a palavra que posso deixar ao General Loureiro dos Santos. Nas últimas horas têm-se sucedido as palavras elogiosas, mas há um aspecto que gostava de sublinhar: era um Homem que sabia pensar! Enquanto jornalista estou habituado a tentar detectar quem sabe pensar, quem consegue construir um silogismo não apenas formalmente correcto, mas correcto também porque utiliza premissas válidas. Essa é a componente de sabedoria que mais me interessa quando procuro alguém que ajude a explicar um acontecimento, uma decisão ou um momento de expectativa face a um qualquer facto que mexa com o Mundo. Porque só assim ajudamos os outros a pensar. Não a pensar da mesma maneira que nós, mas simplesmente a pensar. Porque é essa também a função do jornalismo.

Para além do currículo académico e militar, dos livros e das entrevistas, Loureiro dos Santos era um homem sempre disponível para os jornalistas. E, não é um pormenor sem importância, teve a percepção do erro que foi a guerra iniciada em 2003 no Iraque. Como por estes dias tem sido lembrado, explicou numa entrevista à Rádio Renascença a troca de palavras que manteve com Durão Barroso, então Primeiro-ministro e anfitrião da chamada “Cimeira da Guerra”, nos Açores: “Durão Barroso telefonou-me, estivemos os dois aos berros um com o outro porque ele dizia-me ‘mas eu vi as provas’. Ai viu! Olhe, não acredite nelas”, contou Loureiro dos Santos em Outubro de 2014. Quantos se atreveriam a dizer isto a um Primeiro-ministro, ainda por cima com o Secretário de Estado norte-americano, Colin Powell, a exibir as ditas provas perante o Conselho de Segurança da ONU?
O General Loureiro dos Santos tinha razão. Mas nem todos gostam de assumir o que pensam e há até quem goste de ser enganado, porque fazer-se de parvo também pode trazer benefícios.

Certamente que o General Loureiro dos Santos lia muito. E lia o que outros escreviam, o que é normal e saudável. Quem se dedica às Relações Internacionais, à Geopolítica, conhece as fontes de informação, sabe quem produz conhecimento. Uns ficam-se por fontes associadas ao poder vigente, outros vão mais além. Uns estudam e produzem pensamento próprio, outros limitam-se a debitar o que já leram em escritos alheios. Quem conhece as fontes tem por vezes a sensação do “déjà vu”: eu já li/ouvi isto em qualquer lado! Com o General Loureiro dos Santos não corríamos esse risco e podíamos contar com pensamento próprio.

A última vez que falei com o General Loureiro dos Santos foi em Abril de 2017 quando os Estados Unidos lançaram “A Mãe de Todas as Bombas”, no Afeganistão, junto à fronteira com o Paquistão, supostamente para destruir redes de túneis utilizados por combatentes do Estado Islâmico. Testada (que se saiba) uma única vez em 2003 e usada agora no Afeganistão pela primeira vez em situação de conflito real, apanhou toda a gente de surpresa. O que é isto, foi a pergunta que fizemos na redacção. Pergunta para a qual procurámos resposta junto do General Loureiro dos Santos. “A Mãe de todas as bombas”?, repetiu o General do outro lado da linha. “Explique-me lá melhor o que é isso”, pediu. O Google ajudou: é a MOAB GBU-43. “Ah já sei o que é... ”. Assim foi. E lá nos explicou a capacidade de destruição da besta que pesa mais de 10 toneladas. 

Infelizmente, já não vamos poder voltar a telefonar ao General Loureiro dos Santos para que nos ajude a perceber uma qualquer frente de guerra ou uma qualquer arma que a loucura humana decida criar. Para além do percurso como militar e da intervenção política, que agradarão mais a uns do que a outros, fica o respeito e a admiração amiga por um homem que nos ajudou a saber mais, a ter informação mais completa e a deixar essa marca de relevo que foi a dizer o que pensava.

General Loureiro dos Santos, obrigado e até sempre!

Pinhal Novo, 19 de Novembro de 2018
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josé manuel rosendo