O mais recente livro do General Loureiro dos Santos, publicado no início de 2016
Obrigado,
é a palavra que posso deixar ao General Loureiro dos Santos. Nas últimas horas
têm-se sucedido as palavras elogiosas, mas há um aspecto que gostava de sublinhar: era um Homem
que sabia pensar! Enquanto jornalista estou habituado a tentar detectar quem
sabe pensar, quem consegue construir um silogismo não apenas formalmente correcto,
mas correcto também porque utiliza premissas válidas. Essa é a componente de
sabedoria que mais me interessa quando procuro alguém que ajude a explicar um
acontecimento, uma decisão ou um momento de expectativa face a um qualquer
facto que mexa com o Mundo. Porque só assim ajudamos os outros a pensar. Não a
pensar da mesma maneira que nós, mas simplesmente a pensar. Porque é essa
também a função do jornalismo.
Para
além do currículo académico e militar, dos livros e das entrevistas, Loureiro
dos Santos era um homem sempre disponível para os jornalistas. E, não é um
pormenor sem importância, teve a percepção do erro que foi a guerra iniciada em
2003 no Iraque. Como por estes dias tem sido lembrado, explicou numa entrevista
à Rádio Renascença a troca de palavras que manteve com Durão Barroso, então
Primeiro-ministro e anfitrião da chamada “Cimeira da Guerra”, nos Açores: “Durão
Barroso telefonou-me, estivemos os dois aos berros um com o outro porque ele
dizia-me ‘mas eu vi as provas’. Ai viu! Olhe, não acredite nelas”, contou
Loureiro dos Santos em Outubro de 2014. Quantos se atreveriam a dizer isto a um
Primeiro-ministro, ainda por cima com o Secretário de Estado norte-americano, Colin
Powell, a exibir as ditas provas perante o Conselho de Segurança da ONU?
O
General Loureiro dos Santos tinha razão. Mas nem todos gostam de assumir o que
pensam e há até quem goste de ser enganado, porque fazer-se de parvo também pode
trazer benefícios.
Certamente
que o General Loureiro dos Santos lia muito. E lia o que outros escreviam, o que
é normal e saudável. Quem se dedica às Relações Internacionais, à Geopolítica,
conhece as fontes de informação, sabe quem produz conhecimento. Uns ficam-se por
fontes associadas ao poder vigente, outros vão mais além. Uns estudam e
produzem pensamento próprio, outros limitam-se a debitar o que já leram em
escritos alheios. Quem conhece as fontes tem por vezes a sensação do “déjà vu”:
eu já li/ouvi isto em qualquer lado! Com o General Loureiro dos Santos não corríamos esse risco e podíamos
contar com pensamento próprio.
A
última vez que falei com o General Loureiro dos Santos foi em Abril de 2017
quando os Estados Unidos lançaram “A Mãe de Todas as Bombas”, no Afeganistão, junto
à fronteira com o Paquistão, supostamente para destruir redes de túneis
utilizados por combatentes do Estado Islâmico. Testada (que se saiba) uma única
vez em 2003 e usada agora no Afeganistão pela primeira vez em situação de
conflito real, apanhou toda a gente de surpresa. O que é isto, foi a pergunta
que fizemos na redacção. Pergunta para a qual procurámos resposta junto do
General Loureiro dos Santos. “A Mãe de todas as bombas”?, repetiu o General do
outro lado da linha. “Explique-me lá melhor o que é isso”, pediu. O Google
ajudou: é a MOAB GBU-43. “Ah já sei o que é... ”. Assim foi. E lá nos explicou
a capacidade de destruição da besta que pesa mais de 10 toneladas.
Infelizmente,
já não vamos poder voltar a telefonar ao General Loureiro dos Santos para que
nos ajude a perceber uma qualquer frente de guerra ou uma qualquer arma que a
loucura humana decida criar. Para além do percurso como militar e da intervenção
política, que agradarão mais a uns do que a outros, fica o respeito e a
admiração amiga por um homem que nos ajudou a saber mais, a ter informação mais
completa e a deixar essa marca de relevo que foi a dizer o que pensava.
General Loureiro dos Santos, obrigado e até sempre!
Pinhal
Novo, 19 de Novembro de 2018
josé
manuel rosendo