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segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Falta saber de onde partiu o ataque à Arábia Saudita. E quem é responsável. Houthis, Irão, Iraque ou...?

Houdeida, cidade portuária no Iémen, voltou a ser bombardeada pela Arábia Saudita após os ataques às instalações petrolíferas sauditas. Foto: jmr, Julho 2019




























Analisar a guerra no Iémen não é fácil e a leitura que aponta para uma guerra entre sunitas e xiitas é absolutamente redutora e não retrata a realidade. Se o conflito já tinha contornos bastante opacos, agora, com o ataque às instalações petrolíferas da Arábia Saudita e com a incerteza quanto à autoria desses ataques, tudo ficou ainda mais difícil.
Nada disto tem uma leitura fácil, no sentido de haver “os bons e os maus” ou de se saber exactamente o que motiva cada acção/movimento num conflito armado. Tem sido sempre assim, mas isso deve obrigar-nos a especiais cuidados na análise e ainda mais nas conclusões. 

Sabemos que os Houthis do Iémen reivindicaram o ataque à Arábia Saudita (como muitos outros que fizeram anteriormente) e disseram que é uma resposta aos constantes bombardeamentos de que são alvo por parte da coligação liderada pela Arábia Saudita.

Esta assunção da responsabilidade por parte dos Houthis parece não agradar à Arábia Saudita e aos Estados Unidos e desde o início que o dedo acusador de Riad e de Washington aponta para Teerão. Ainda foi admitida a possibilidade de o Iraque ter sido ponto de partida do ataque, mas Bagdad negou e não se voltou a falar nisso.

Teerão também rejeita responsabilidade, mas a Arábia Saudita mostrou o que disse ser provas inegáveis do envolvimento do Irão. Segundo Riad, terão sido utilizados 25 drones e mísseis contra as instalações sauditas, incluindo um avião não-tripulado iraniano e mísseis de cruzeiro Ya Ali (construídos no Irão). O Ministério da Defesa saudita disse que o ataque chegou do Norte e foi inquestionavelmente patrocinado pelo Irão. Isto é o que temos: uma convicção e restos de material iraniano.

Para o Secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, existe um consenso no Golfo de que a responsabilidade é do Irão e que o ataque às instalações sauditas foi “um acto de guerra”. É certo que Pompeo também disse que quer uma solução pacífica, mas Washington já decidiu reforçar a sua presença militar na Arábia Saudita. A incerteza e a falta de provas concretas traduzem-se em declarações reproduzidas na comunicação social e atribuídas a altos responsáveis norte-americanos, mas sempre a coberto do anonimato.

Não deixa de ser curioso que depois das acusações ao Irão, a Arábia Saudita tenha bombardeado alvos em Houdeida (cidade portuária no Iémen) com o argumento de que daí partiam ataques com mísseis e drones.

Temos ainda na memória os recentes ataques a petroleiros no Golfo de Omã. O dedo acusador foi inicialmente apontado ao Irão, houve muito burburinho, mas tudo se perdeu na espuma dos dias: de concreto, rigorosamente nada! Houve sim, mais sanções, que os donos do mundo aplicam, sempre que entendem, a seu bel-prazer. E também temos na memória a forma como a Arábia saudita tentou negar responsabilidade no assassínio do jornalista Jamal Khashoggi, até ter de se render às evidências.

A situação criada com o mais recente ataque à Arábia Saudita coloca-nos ainda uma questão incontornável para podermos ter uma noção sobre o que realmente aconteceu: tenha sido a partir do Yémen, do Irão ou do Iraque, como é possível que vários drones tenham voado centenas de quilómetros, sem deixarem rasto/registo, num território que deve ser dos mais vigiados do Mundo?

Será útil recordar que o Bahrein, a menos de cem quilómetros de Abqaiq - um dos locais atacados na Arábia Saudita - alberga a 5ª Frota da Marinha dos Estados Unidos (responsável pela região do Médio Oriente) e alberga também uma base britânica. Na região há também outras bases norte-americanas. Não sendo especialista em Defesa, tenho dificuldade em perceber como é que drones, aviões não-tripulados e mísseis, cruzam este território – um dos mais vigiados do mundo – sem serem detectados. Dizem os entendidos que os drones podem voar quase rente ao solo e por isso difíceis de detectar... E que nem sempre os satélites e os radares estão “apontados” para as zonas que terão sido utilizadas nos ataques. Dizem-me também que até poderão eventualmente ter sido detectados mas num momento em que já não havia tempo para a intercepção. Tudo isso pode ser verdade, e até pode ser que estejam agora a ser revistos os sistemas de vigilância da região para verificar se ficou registada a passagem dos instrumentos utilizados nos ataques. 

Perante situações anteriores em que a credibilidade de alguns protagonistas ficou de rastos, por terem forjado provas, será bom que as eventuais provas encontradas desta vez não deixem qualquer tipo de dúvidas.

Principalmente os Estados Unidos ficam muito mal neste episódio se a passagem dos drones, aviões e mísseis, não foi notada e dela não ficaram registos. 

Ou então teremos de questionar quem terá essa capacidade de utilizar drones, aviões não-tripulados e mísseis, sem deixar qualquer tipo de rasto.

Destes recentes ataques (aos petroleiros e às instalações petrolíferas sauditas) resultam dúvidas que importa esclarecer de forma muito rigorosa, sob pena de ganhar força a teoria de que alguém quer mesmo implicar o Irão e arrastar o mundo para mais uma guerra no Médio Oriente. Sabemos todos quem mais ganha com isso.

No meio deste desassossego, as Nações Unidas enviaram peritos à Arábia Saudita para tentar desvendar o mistério da responsabilidade do ataque. Até que mais alguma coisa se saiba, António Guterres referiu-se à necessidade de “nervos de aço” para evitar uma nova guerra.


Pinhal Novo, 23 de Setembro de 2019

josé manuel rosendo


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