sexta-feira, 29 de maio de 2015

Ao dinheiro o que é do dinheiro

No início desta semana o DN publicou um artigo brilhante assinado pelo editor do Financial Times, Wolfgang Münchau. Confesso que não sei quem o senhor é nem me dei ao trabalho de googlar. Mas sei que é editor do Financial Times, essa quase bíblia sempre referida com reverência por parte da nomenclatura nacional. E eu, sabendo isto, e porque parto sempre do princípio um pouco naïf de que quem chega a editor – ou director, ou seja lá o que for… – num órgão de informação, deve saber o que anda a fazer e a dizer, dou-lhe suficiente importância para lhe dedicar meia-dúzia de linhas.

O artigo em causa é a propósito da Grécia e, claro, Tsipras, esse bandido, que recusa ser bom aluno dos extremistas neoliberais. Desde logo, Münchau diz ao que vem e separa “constrangimentos económicos” de “constrangimentos políticos”. Isto é, ao dinheiro o que é do dinheiro. Essa coisa menor que é a política não importa a Wolfgang Münchau. Continua a fazer caminho a ideia de que a política deve submeter-se aos ditames da economia. Convém que assim seja. 

O editor do Financial Times explica que os “os constrangimentos políticos” são lá com Tsipras, mas ele, Münchau, quer discorrer sobre os “constrangimentos económicos”. E é então que o mago revela o interior da cartola: o acordo entre a Grécia e os credores dependerá do valor de superavit primário que ficar estabelecido. Isto é, os credores querem saber quanto fica nos cofres depois do Estado grego somar todas as despesas com vencimentos, pensões e afins; os credores querem saber quanto sobra, não para pagar a dívida, mas para pagar o serviço da dívida; os credores querem saber como é que a Grécia lhes vai encher o prato com essa especiaria chamada juros.

Uma coisa sempre me inquietou nesta coisa dos resgates e afins. Se agora, em relação aos países endividados, os credores exigem “ajustamento orçamental” (entenda-se austeridade: políticas de cortes em vencimentos, pensões e serviços) por que não fizeram a análise da possibilidade de pagamento antes de fazerem os empréstimos? Porquê agora, quando a Grécia (e os outros…) está com a corda no pescoço? Porque FMI, CE e BCE está cheia de gente competente, apenas encontro uma resposta: foi má-fé! Não é nova a receita de emprestar para depois, perante a incapacidade de pagamento, os credores ocuparem os territórios endividados. Noutros tempos foi mesmo ocupação militar e política; agora é ocupação financeira. Se houver “bons alunos” entre os nativos endividados, ainda melhor.

Regressando a Münchau, ele próprio critica os credores por terem oferecido à Grécia um “pacto com o diabo” aquando de anteriores empréstimos feitos na perspectiva de um superavit futuro de valores intangíveis. Mais uma vez: má-fé! A Grécia ficou de tal modo sem saída para a dívida que vai ter que ser um país à vontade dos credores, desenhado como se não houvesse povo nem território mas apenas uma enorme conta de deve e haver cujas parcelas têm que corresponder aos anseios dos credores. E nós sabemos bem do que significam “ajustamentos orçamentais”.

Pensando de dentro do sistema e, obviamente, de acordo com o sistema que tem por máxima “quem paga as contas é quem manda”, Wolfgang Münchau apresenta a solução ideal: deduz-se do seu texto que um superavit primário entre 1,5% e 2,5% do Produto Interno Bruto da Grécia seria algo razoável e que dentro dessa margem o país seria viável. Isto é: Wolfgang considera que a corda no pescoço da Grécia deve ser bem apertada, mas de modo a que a desgraçada, pendurada na forca, consiga tocar com a ponta dos pés no estrado do cadafalso. O equilíbrio é precário mas os Euros dos juros vão continuar a chegar aos bolsos dos usurários.

Manter o Sistema. Sempre. Talvez seja por isso que Wolfgang Münchau é Editor do Financial Times.

Pinhal Novo, 29 de Maio de 2015

josé Manuel rosendo