Estou cansado dos que me tentam convencer que, por ser
jornalista, não posso/devo tornar pública a minha opinião sobre tudo aquilo que
bem me apetecer: política, economia, futebol, decisões do Governo ou do
Presidente da República, a guerra no Afeganistão, a Primavera Árabe, o
aquecimento global, o casamento gay…
Muitas vezes, os que assim pensam (que não devo ter opinião),
argumentam que isso me fragiliza se alguma vez tiver que entrevistar ou
escrever notícias sobre protagonistas a quem eventualmente tenha criticado uma
decisão ou uma atitude. Este tipo de argumento que procura condicionar a minha
Liberdade, mais não é do que um convite ao pensamento único (regra geral o dos
que têm poder, seja ele qual for, porque são eles os potenciais entrevistados
ou protagonistas em relação aos quais me posso sentir fragilizado…) ou então é
um convite para que seja um jornalista “bem-comportado”, que guarde para mim as
minhas opiniões, que me limite a ser um bom pastor do respeitinho bonito e
devido a quem manda, não vá aparecer a polícia dos costumes a cortar-me a língua.
Estou cansado desta lenga-lenga. Quem quer guardar opiniões
que o faça; quem quer ser “bem-comportado” que o seja; quem tem medo que lhe
cortem a língua que compre um cão. Ter opinião sobre a vida e sobre a sociedade
(é isso a política) não é o mesmo que ser adepto de um clube de futebol. A opinião
política (no sentido de que isso é ter opinião sobre a nossa vida) é racional,
sustentada ideológica e por vezes cientificamente; as opções clubísticas são
irracionais, são afectos que só o coração pode explicar. Defender opções políticas
significa, em minha opinião, defender o que considero ser melhor para o todo da
comunidade de que faço parte; ser adepto de um clube de futebol significa
desejar a vitória do meu clube e, por defeito, a derrota do adversário. Há quem
não consiga entender a diferença e meta tudo “no mesmo saco”.
Há também quem veja uma simples opinião sobre um qualquer
acontecimento como um acto de política partidária. Esses são os que pararam no
tempo e não conseguem perceber a vida, a política e o poder, para além de um
quadro que começa e termina na luta partidária; Outros, conscientemente, apenas
tentam pressionar, criar desconforto, para que aqueles que têm opinião se
sintam inseguros ou amedrontados e não divulguem opiniões que podem ser “perigosas”
para o status quo; Outros ainda, apenas não querem que surjam opiniões porque
depois sentem-se mal por não terem coragem ou capacidade para, eles próprios,
elaborarem e fundamentarem uma opinião que os vai expor – é disso que têm
receio, são inseguros – e , eventualmente (qual é o problema?), mostrar que estão
errados ou fizeram uma análise a que falta informação importante; outros ainda,
são ingénuos e pensam que se ficarem caladinhos, são vistos como uns tipos
porreiros que não criam problemas e conseguem passar pelos intervalos da chuva
(vá lá saber-se para onde querem ir…). Outro aspecto não menos importante: ter
opinião dá trabalho!
Enquanto jornalista, para além de não abdicar do meu direito
de ter opinião, considero aliás que é minha obrigação ter opinião. Porquê?
Porque temos mais informação que o comum do cidadão, porque temos acesso
directo a fontes, porque sabemos onde procurar a informação que pode sustentar
uma opinião e porque, afinal, tendo esse privilégio de estar onde as coisas
acontecem, temos o dever de o partilhar, relatando com rigor e, se for caso
disso, dar conta da nossa percepção sobre os acontecimentos, fazendo análise e
quando tal considerarmos necessário, dar opinião. Não preciso de dizer que nada
do que atrás referi se pode misturar: tudo bem separado, para que quem recebe a
informação possa distinguir sem nenhuma dúvida o que é uma notícia, uma
reportagem, uma crónica, uma análise ou uma opinião.
Dito isto, mantenho o meu direito/dever de ter e publicar a
minha opinião. Vale o que vale, mas é minha e não abdico desse direito. Aliás,
nunca uma opinião minha incluiu referências ofensivas ou ataques pessoais aos
protagonistas. São ideias que contraponho a outras ideias. Se não é isto a
Democracia, então não sei o que é e é por isso que a minha opinião não pode
fragilizar-me.
Se puderem (mesmo através da Internet…), vão ao museu do
Apartheid, em Joanesburgo, ou ao Yad Vashem, em Jerusalém. Se quiserem mais
perto, vão ao Forte de Peniche (não digo para irem à sede da PIDE na Rua António
Maria Cardoso, em Lisboa, porque alguns que a democracia permitiu que fossem
eleitos fizeram questão de esconder essa memória), para saberem o preço que
alguns pagaram pela Liberdade, o preço que pagaram por lutar contra a opressão,
a discriminação, o medo…
Se há coisa que tentarei nunca fazer é ser ingrato para
aqueles que deram a vida ou parte dela, que sofreram, para que eu hoje possa
dizer que sou livre e posso ter opinião. A melhor forma de o fazer é lutar por
essa Liberdade, tendo opinião e não me deixando amedrontar ou pressionar por
gente que por ter medo de ter opinião quer aprisionar os outros nessa redoma de
cobardia.
À Liberdade trato-a como a uma flor que quero deixar bem
viva nas mãos dos meus filhos. Lamento, mas vou continuar a ter opinião.
josé manuel rosendo
pinhal novo, 12 de Julho de 2013
PS - foto (jmr) tirada em Benghazi, Líbia, 28 de Fevereiro de 2011. Os Líbios lutavam pela liberdade e escreveram isso até nas paredes interiores dos edíficios por onde borbulhava a revolta.
Subscrevo.
ResponderEliminarNão esqueço a "Brigada do Lápis Azul" e a sua acção para que quem escrevia nos jornais conservasse a sua pureza, vendo eliminado tudo o que fosse a sua opinião, a menos que fosse coincidente com os ensinamentos que o chefe nos facultava e que, com tanta ingratidão rejeitávamos.