Que me perdoem alguns dos meus amigos, mas punhos de camisa
branca (e respectivos botões…) a saírem da manga do casaco e gravata de seda,
deixam-me cada vez mais desconfiado. Mais pés tivesse e mais de pé atrás
ficaria sempre que me cruzo com uma destas personagens.
Estou habituado a pagar o preço de uma vida que tem as
amizades que o percurso vai ditando, sem nenhum calculismo em relação a isso.
Relaciono-me com quem muito bem entendo: de esquerda, de direita, bem e mal vestidos,
indiferente à opção sexual, administradores ou membros das comissões de
trabalhadores e dos sindicatos, religiosos, ateus e agnósticos, doutorados ou
analfabetos. Não raramente, alguns daqueles com quem me relaciono não gostam
que me me relacione com outros daqueles com quem também me relaciono. Pago esse
preço com todo o gosto porque é o preço da minha Liberdade. E assim vai
continuar a ser. Mas confesso que estou a começar (não de agora…) a ficar com
um preconceito e que é cada vez maior a vontade de “passar para o outro lado da
rua” quando se aproxima gente bem vestida. Eu sei que posso estar a ser muito
injusto para gente que apenas gosta de andar “bem vestida” e sei que “vestir
bem” pode ser apenas uma forma de estar e andar na vida, um prazer como qualquer
outro (como rapar o cabelo, pintá-lo de verde ou usar uma argola na ponta do
nariz) mas é, infelizmente, uma imagem de marca dos maiores vigaristas.
Já nem me refiro ao caso BES e à estratégia de comunicação
utilizada até sabermos que há mesmo um buracão. Lembram-se certamente dos
muitos analistas a referirem de início que o BES tinha “almofada” financeira
que cobria uma eventual exposição aos produtos tóxicos de outras empresas
Espírito Santo. Já nem me refiro à forma como o valor do buraco foi aumentando,
mas atenuado na opinião pública com os analistas “almofadas” que nos acalmavam
diariamente e em grandes doses. Já nem me refiro às declarações políticas, do
governo e da (alguma dita) oposição. Já não me refiro a nada mas apenas à
certeza de que andámos a ser enganados durante muito tempo.
Enganados desde logo por um homem que dizia que os
portugueses preferiam o subsídio de desemprego a terem um trabalho de onde resultasse
um salário. Um homem de belas camisas brancas e vistosas gravatas, com uns
brilhantes óculos na ponta do nariz. Há lá imagem mais credível…
Mas não me venham dizer que foi apenas ele. Com ele estão
certamente muitos que arrecadaram belas compensações por “metas atingidas” em
negócios de vigaristas. Com ele estão certamente muitos que apenas olhavam os
números, sem os questionar, apenas com a sofreguidão de saberem quanto lhes
iria cair na conta. De reguladores não vale a pena falar, porque ser regulador
para, invariavelmente, quando se descobre cada vigarice, vir dizer que o
regulador não tem poderes de polícia, então mais vale não existirem.
Quanto a punhos de camisas brancas a saírem das mangas do casaco,
a par das notícias sobre o BES, a notícia de que o nosso futuro comissário
europeu, tem também ele no currículo, uma passagem pela Goldamn Sachs – um dos
bancos da crise de 2008 – e foi um dos homens da linha da frente nas
negociações com a troika e na defesa da ultra austeridade que nos foi imposta.
Também José Luís Arnaut vai para o
Conselho Consultivo da Goldman Sachs. O Expresso contou que Arnaut teve um
papel na venda dos CTT e que o Goldaman Sachs ficou com quase 5% do capital dos
CTT. O Expresso contou também que a firma de advogados de Arnaut (CMS Rui Pena
& Arnaut) representou os interesses de bancos como o Goldaman Sachs e o
JPMorgan nas negociações dos swaps com o Estado português.
E temos Vítor Gaspar, antigo Ministro
das Finanças, que foi para o FMI. Não é necessário falar do FMI. E o antigo
Ministro da Economia, Álvaro Santos Pereira, foi para a OCDE. E pronto, é isto
que temos.
E agora poderão perguntar: é crime o percurso destes homens e o que
eles fizeram pelo caminho? E aí responderei: depende da Lei. É evidente que os
actos praticados não configuram nenhum crime à luz da lei vigente.
Mas uma coisa é certa: alguns dos
actos de muitos destes protagonistas com punhos de camisa branca a sair da manga do
casaco e respectiva gravata de seda, o lugar deles é num qualquer cadastro e
não num currículo que, à partida, é algo que abona a favor do seu sujeito. Como
é evidente, depende do ponto de vista.
josé manuel rosendo
6 de Agosto de 2014
PS: também tenho camisas brancas e umas gravatitas velhas
embora não sejam de seda.
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