A foto foi publicada no Middle East Eye e frase completa (que serviu para título) é esta: “nunca saberemos o número exacto [dos que morreram agora
no Mediterrâneo], nunca conheceremos a sua identidade, mas os sobreviventes
dizem que morreram mais de 500 pessoas”. A frase é de Carlotta Sami (uma porta-voz
do ACNUR – Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados) e foi
escrita no Twitter.
Esta frase deveria fazer-nos pensar. Mais uma vez.
A Primavera anunciava-se. É a estação das ofensivas militares e,
dizia-se à boca cheia, iria ser o momento de uma nova vaga de refugiados em
direcção à Europa. Mas a Europa, fechado o acordo com a Turquia - um acordo
criticado por um elevado número de organizações não-governamentais e até pelo ACNUR
- descansou. Mesmo não tendo qualquer garantia de que o acordo com a Turquia
seja cumprido (face às exigências turcas a qualquer momento o acordo pode
fracassar), a Europa descansou. O acordo entrou em vigor a 20 de Março.
Mesmo com este acordo, a
Organização Internacional para as Migrações revela que em Abril chegaram à Grécia
3.360 refugiados, contra 26.971 chegados em Março. A Frontex (Agência Europeia
de Fronteiras) refere que a chegada de refugiados à Grécia caiu 90%. Mas é uma
ilusão.
Cortada a rota do Mar Egeu entre a Turquia e as Ilhas gregas, uma outra
rota ganha uma nova dinâmica. Da costa da Líbia, os barcos fazem-se ao Mar com
a Europa no horizonte. Sem meias-palavras, outro porta-voz do ACNUR, William
Spindler, admite que possam ter morrido 700 pessoas durante a última semana. Ainda
um outro porta-voz do ACNUR, Federico Mossi, admite que a situação é caótica.
Parece que vai ser preciso outra criança, outro Aylan, fotografado morto numa
praia, para que os bem instalados de Bruxelas voltem a levantar-se para fazer
alguma coisa e para que as primeiras páginas dos jornais regressem ao drama. Já anda por aí a fotografia de um bebé, morto, nos braços do homem que o resgatou após um naufrágio. Foi divulgada por uma ONG alemã ("Sea-Watch"). Depois, a emoção voltará a esfumar-se.
Se não fosse trágico, o ritmo de "recolocação" de refugiados
na União Europeia, seria para rir. Passado o alvoroço das imagens de refugiados
a chegarem e a caminharem Europa dentro, a Europa voltou a entreter-se com os
défices, os orçamentos, e as eventuais sanções. Enquanto a União Europeia vive
enleada em reuniões do Ecofin, do Eurogrupo, do Conselho e da Comissão
Europeia, do Banco Central Europeu, a questão dos refugiados promete voltar a
fazer manchetes.
Para algumas consciências é melhor assim. Para os espíritos mais
inquietos é um pesadelo. Cada um saberá a qual destes grupos prefere pertencer.
Pinhal Novo, 30 de Maio de 2016
josé manuel rosendo
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