Este cartoon foi publicado em http://jornalggn.com.br
Quem põe ordem nesta Europa? Esta é a pergunta perigosa que nos arriscamos a que
alguém faça se a Europa não mudar de rumo. E não há mudança que se vislumbre,
pelo menos se continuarem as actuais lideranças (diga-se, herdeiras de outras
muito semelhantes). Responder à pergunta feita em título, arrasta perigos que é
desnecessário lembrar.
Os homens e mulheres que têm mandado – é esta a
expressão “têm mandado” – na União Europeia não têm desculpa. Fizeram de tudo
para construir instituições com a maior fragilidade que é possível ter em
democracia: falta de uma base popular de apoio. E não têm essa base de apoio,
em primeiro lugar porque nunca a quiseram - eles mandam e portanto decidem – e em
segundo lugar porque nunca perguntaram ao povo o que o povo pensa.
A União Europeia foi construída na base da cedência
de soberania. Uma cedência dos Estados em nome de um bloco de países
supostamente unidos, tendo como objectivo manter a paz na Europa e desenvolver
as economias para construir um espaço em que os Direitos Humanos fossem o
principal farol. Acontece que a soberania é algo de que o povo de cada país é o
único titular e a cedência de soberania devia ter sido referendada ou, pelo
menos, o povo devia ter sido consultado de alguma forma muito directa sobre
essa questão. Não o foi em Portugal nem na maioria dos países da União
Europeia. Não é por acaso que a Constituição da República nos
diz que “A soberania, una e indivisível, reside no povo, que a exerce segundo
as formas previstas na Constituição”. Eu sei que vão dizer, alguns, que o povo
elege representantes e que as decisões desses representantes são absolutamente
legais e legítimas. Discordo!
Por outro lado, a União Europeia cresceu de forma
descontrolada e nem sempre pelas melhores razões, ou pelas mais nobres. Sabemos
como Portugal, pós-PREC, se atirou para os braços da CEE, não precavendo nada
daquilo de que hoje nos queixamos (pescas, indústria, etc..) porque era preciso afastar de vez o “perigo comunista”; sabemos como aderimos a uma moeda (Euro)
que mais não foi do que o Marco alemão; sabemos que aceitámos limites ao défice
(3%) que era precisamente o da Alemanha; sabemos como o alargamento a Leste, em
muitos casos, apenas pretendeu afastar alguns países da esfera da Rússia após a
queda da União Soviética. E sabemos, recentemente, como alguns países foram hostilizados
por uma elite de eurocratas, revelando um total desprezo pelos povos.
O Brexit, para o bem e para o mal, foi uma pedrada
no charco. A estratégia dos bem-instalados nesta União Europeia está já muito
clara: tentam colocar no mesmo barco uma extrema-direita nacionalista de
contornos fascistas e todos aqueles que têm criticado as políticas europeias por
elas atenderem mais à finança do que ao povo e por estarem a desvirtuar os
princípios declarados que estiveram na origem da actual União Europeia. Estão a
tentar estabelecer essa confusão e receio que sejam bem-sucedidos. Agitar o
medo é sempre uma arma poderosa.
Logo que foi conhecido o resultado do referendo no
Reino Unido, os principais líderes europeus apressaram-se a confirmar que o
povo tem razão e que esta União Europeia de pouco ou nada nos serve.
Os “fundadores” da União Europeia rapidamente
marcaram encontro e a Chanceler alemã, Angela Merkel, rapidamente
"convidou" François Hollande e Matteo Renzi para um encontro. Onde?
Em Berlim! E é exactamente este tipo de atitudes que revelam uma União Europeia
que não é a União Europeia da democracia, de uma União entre iguais, de uma
União solidária, de uma união dos povos e das regiões. É uma União Europeia de
um directório e não de 27 ou 28. É uma União Europeia em que uns mandam e
outros obedecem.
Outro sinal evidente da aparente falta de berço
democrático de alguns dirigentes europeus foi a reacção de Jean Claude Juncker,
presidente da Comissão Europeia. Dirigiu-se ao povo do Reino Unido, qual marido
despeitado a quem a mulher acaba de pedir o divórcio: se te queres ir embora,
vai e depressa.
Esta segunda-feira, no Parlamento Europeu (é ver a
troca de acusações numa qualquer tv) estalou o verniz que ainda resistia e
assistiu-se a uma absoluta falta de decência. Houve quem lembrasse aos
britânicos que a União Europeia lhes paga os ordenados há muitos anos e que já
ali não deviam estar; do lado oposto, houve alguém que retorquiu: “riram-se
quando vim aqui falar do referendo, mas agora já não estão a rir”: É assim que
estamos. José Manuel Pureza está carregado de razão quando diz que esta União
Europeia alimenta "a besta da extrema-direita".
O mais dramático é que, alimentar a esperança de que
o resultado do referendo no Reino Unido conduza a um repensar da União Europeia
e a um mudança de rumo, é pura ingenuidade ou então é uma grande hipocrisia de
quem utiliza o argumento apenas porque quer que tudo continue exactamente como
está. O salto em frente vai ser o federalismo. Novo erro. O que a União
Europeia precisa é de países mais livres.
josé manuel rosendo
28 de Junho de 2016
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