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segunda-feira, 9 de setembro de 2019

Iémen, cada vez pior...

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Manifestação de apoio ao Movimento Separatista do Sul. A bandeira em primeiro plano é a dos separatistas, a mesma da República Democrática Popular do Iémen (1967-1990). Créditos da fotografia: en.adenpress.news
Estava confusa a situação no Yemen? Sim, é verdade, mas ficou um pouco pior. O “xadrez” da guerra ganhou novos contornos com a desavença entre parceiros da coligação que combate os Houthi. Há muito se falava dos diferentes interesses dos dois principais parceiros de coligação, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos (EAU), mas agora esse antagonismo ficou evidente quando o Movimento Separatista do Sul avançou para o controlo da cidade de Aden, onde está o Governo do Presidente Hadi, reconhecido internacionalmente. Separatistas (com o apoio dos EAU) e tropas governamentais envolveram-se em violentos combates e os separatistas conseguiram o controlo da cidade. A Arábia Saudita reafirmou apoio ao Governo do Presidente Hadi.


Não se sabe como vai terminar esta guerra dentro da guerra, mas o Movimento Separatista pretende regressar à fórmula Iémen do Norte/Iémen do Sul – e até já tem o Conselho de Transição do Sul – algo que os Emirados parecem aceitar e que a Arábia Saudita já disse que recusa. O apoio dos EAU aos separatistas foi ao ponto de lançarem ataques aéreos contra as forças governamentais quando estas tentaram reconquistar a cidade às forças do Movimento Separatista. A confusão é de tal ordem que as agências de notícias dão conta de manifestações de apoio aos separatistas, em Aden, com as pessoas a exibirem bandeiras do Movimento Separatista, dos EAU, mas também da Arábia Saudita, principal apoiante do Governo que os separatistas agora combatem.

O Governo do Presidente Hadi recusa dialogar com os separatistas acusando-os de serem apenas um instrumento dos EUA que, por sua vez, pretendem dividir o Iémen. Apesar das acusações, o Governo diz que só aceita negociar com os EAU. Desde Junho que os EAU reduziram a presença militar no Iémen, mas a influência mantém-se através dos milhares de combatentes do Movimento Separatista, armados e treinados pelos EAU.

Os Estados Unidos anunciaram pela primeira vez que estão envolvidos em negociações com os Houthi. Não se sabe como nem onde, mas fontes ligadas ao processo e citadas pelo Wall Street Journal disseram que pode ser no Sultanato de Omã. Não seria a primeira vez que Omã serve de mediador já que Barack Obama também recorreu ao Sultanato quando iniciou as conversações que terminaram no Acordo Nuclear com o Irão, assinado em 2015.

Por agora, Arábia Saudita e EAU dizem que a coligação está unida e permanece forte no objectivo de combater os Houthi. Certo é que Sanaa foi tomada pelos Houthi em 2014 e desde então a coligação poucos ganhos tem conseguido, sendo que os Houthi mantêm a Arábia Saudita na linha de fogo com ataques frequentes a território saudita.

Os peritos da ONU referiram-se recentemente a um grande número de crimes de guerra cometidos no Iémen e para resumirem a questão acrescentaram que nesta guerra ninguém tem as mãos limpas. A lista de nomes que podem vir a ser acusados – no caso de haver um tribunal para a guerra no Iémen – é extensa, mas permanece confidencial. A lista de crimes é igualmente extensa: de ataques indiscriminados contra populações civis, à utilização da fome como arma de guerra, passando por tortura e violações. O relatório vai ser conhecido na totalidade quando for apresentado, esta terça-feira, 10 de Setembro, ao Conselho de Direitos Humanos da ONU.

O mesmo grupo de peritos alerta a comunidade internacional para se abster de fornecer armas que possam ser utilizadas na guerra no Iémen e adverte para a eventual ilegalidade das vendas de armamento feitas pela França, Reino Unido, Estados Unidos e outros Estados. Os peritos dizem que a legalidade da venda de armas é discutível e os Estados podem vir a ser responsabilizados por violação do Direito Internacional se a cumplicidade ficar provada.

O Iémen continua a precisar de grande ajuda externa e o Plano de Resposta Humanitária 2019 requer cerca de 3 mil e 800 milhões de euros para prestar assistência a mais de 20 milhões de pessoas, mas o financiamento conseguido ainda não chega aos 40%.

Pinhal Novo, 9 de Setembro de 2019
josé manuel rosendo


quarta-feira, 29 de junho de 2016

Quem põe ordem nesta Europa?

Este cartoon foi publicado em http://jornalggn.com.br 

Quem põe ordem nesta Europa? Esta é a pergunta perigosa que nos arriscamos a que alguém faça se a Europa não mudar de rumo. E não há mudança que se vislumbre, pelo menos se continuarem as actuais lideranças (diga-se, herdeiras de outras muito semelhantes). Responder à pergunta feita em título, arrasta perigos que é desnecessário lembrar.

Os homens e mulheres que têm mandado – é esta a expressão “têm mandado” – na União Europeia não têm desculpa. Fizeram de tudo para construir instituições com a maior fragilidade que é possível ter em democracia: falta de uma base popular de apoio. E não têm essa base de apoio, em primeiro lugar porque nunca a quiseram - eles mandam e portanto decidem – e em segundo lugar porque nunca perguntaram ao povo o que o povo pensa.

A União Europeia foi construída na base da cedência de soberania. Uma cedência dos Estados em nome de um bloco de países supostamente unidos, tendo como objectivo manter a paz na Europa e desenvolver as economias para construir um espaço em que os Direitos Humanos fossem o principal farol. Acontece que a soberania é algo de que o povo de cada país é o único titular e a cedência de soberania devia ter sido referendada ou, pelo menos, o povo devia ter sido consultado de alguma forma muito directa sobre essa questão. Não o foi em Portugal nem na maioria dos países da União Europeia. Não é por acaso que a Constituição da República nos diz que “A soberania, una e indivisível, reside no povo, que a exerce segundo as formas previstas na Constituição”. Eu sei que vão dizer, alguns, que o povo elege representantes e que as decisões desses representantes são absolutamente legais e legítimas. Discordo!

Por outro lado, a União Europeia cresceu de forma descontrolada e nem sempre pelas melhores razões, ou pelas mais nobres. Sabemos como Portugal, pós-PREC, se atirou para os braços da CEE, não precavendo nada daquilo de que hoje nos queixamos (pescas, indústria, etc..) porque era preciso afastar de vez o “perigo comunista”; sabemos como aderimos a uma moeda (Euro) que mais não foi do que o Marco alemão; sabemos que aceitámos limites ao défice (3%) que era precisamente o da Alemanha; sabemos como o alargamento a Leste, em muitos casos, apenas pretendeu afastar alguns países da esfera da Rússia após a queda da União Soviética. E sabemos, recentemente, como alguns países foram hostilizados por uma elite de eurocratas, revelando um total desprezo pelos povos.

O Brexit, para o bem e para o mal, foi uma pedrada no charco. A estratégia dos bem-instalados nesta União Europeia está já muito clara: tentam colocar no mesmo barco uma extrema-direita nacionalista de contornos fascistas e todos aqueles que têm criticado as políticas europeias por elas atenderem mais à finança do que ao povo e por estarem a desvirtuar os princípios declarados que estiveram na origem da actual União Europeia. Estão a tentar estabelecer essa confusão e receio que sejam bem-sucedidos. Agitar o medo é sempre uma arma poderosa.

Logo que foi conhecido o resultado do referendo no Reino Unido, os principais líderes europeus apressaram-se a confirmar que o povo tem razão e que esta União Europeia de pouco ou nada nos serve.
Os “fundadores” da União Europeia rapidamente marcaram encontro e a Chanceler alemã, Angela Merkel, rapidamente "convidou" François Hollande e Matteo Renzi para um encontro. Onde? Em Berlim! E é exactamente este tipo de atitudes que revelam uma União Europeia que não é a União Europeia da democracia, de uma União entre iguais, de uma União solidária, de uma união dos povos e das regiões. É uma União Europeia de um directório e não de 27 ou 28. É uma União Europeia em que uns mandam e outros obedecem.

Outro sinal evidente da aparente falta de berço democrático de alguns dirigentes europeus foi a reacção de Jean Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia. Dirigiu-se ao povo do Reino Unido, qual marido despeitado a quem a mulher acaba de pedir o divórcio: se te queres ir embora, vai e depressa.
Esta segunda-feira, no Parlamento Europeu (é ver a troca de acusações numa qualquer tv) estalou o verniz que ainda resistia e assistiu-se a uma absoluta falta de decência. Houve quem lembrasse aos britânicos que a União Europeia lhes paga os ordenados há muitos anos e que já ali não deviam estar; do lado oposto, houve alguém que retorquiu: “riram-se quando vim aqui falar do referendo, mas agora já não estão a rir”: É assim que estamos. José Manuel Pureza está carregado de razão quando diz que esta União Europeia alimenta "a besta da extrema-direita".

O mais dramático é que, alimentar a esperança de que o resultado do referendo no Reino Unido conduza a um repensar da União Europeia e a um mudança de rumo, é pura ingenuidade ou então é uma grande hipocrisia de quem utiliza o argumento apenas porque quer que tudo continue exactamente como está. O salto em frente vai ser o federalismo. Novo erro. O que a União Europeia precisa é de países mais livres.

josé manuel rosendo

28 de Junho de 2016

sexta-feira, 17 de junho de 2016

Reino Unido - Plano B (não é de Brexit)

(A ilustração é de Arend van Dam e foi publicada em www.voxeurop.eu a partir de um artigo do Le Fígaro)

Referendo no Reino Unido a 23 de Junho. David Cameron tem os calos apertados. O primeiro-ministro britânico calçou uma bota que nunca pensou lhe viesse a dificultar tanto a caminhada. Em plena campanha eleitoral na Primavera de 2015, Cameron decidiu calar a oposição interna, principalmente os eurocépticos, prometendo um referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia. Logo depois de eleito, com uma maioria absoluta do Partido Conservador, David Cameron apressou-se a dizer que a promessa era para cumprir. Honra lhe seja feita, porque cumprir o prometido é coisa cada vez mais rara nos tempos que correm. 

Até em Portugal, tivemos um Primeiro-ministro que prometeu um referendo ao então Tratado Constitucional da União Europeia. Sucede que França e Holanda anteciparam-se rejeitando o Tratado através de referendos. O Tratado Constitucional passou então a Tratado de Lisboa. O Primeiro-ministro passou então a defender que ninguém deveria coloccar em causa a legitimidade do Parlamento para ratificar o Tratado. Estava em causa a palavra de um Primeiro-ministro mas o referendo foi mandado às urtigas. Porreiro, pá! Os portugueses continuaram numa União em que ninguém lhes pergunta rigorosamente nada.

No Reino Unido, ao que parece, ainda há quem tenha vergonha de dar a palavra num compromisso e depos fazer três piruetas para mudar de rumo. É a vida. E o referendo vai mesmo realizar-se. 

Independentemente do resultado - quer o Reino Unido fique ou não na União Europeia - pode ser (deveria ser...) uma oportunidade para repensar a União Europeia. O beco a que chegou é fruto de políticas erradas e mais becos estão à vista se não arrepiar caminho. As crises nos 28 são um sintoma óbvio da doença. O problema é que aqueles que conduziram a Europa por este caminho defendem precisamente este caminho. Pensar que as crises lhes vão ensinar alguma coisa é pura ilusão. A União Europeia tem sido construída sem uma base popular de apoio e essa é a sua maior fragilidade. 

Assim sendo, não supreenderia que, perante as sondagens a darem uma maioria favorável à saída do Reino Unido da União Europeia, já esteja a ser pensada uma repetição do referendo. A estratégia não seria novidade. Em 1992, os dinamarqueses disseram Não ao Tratado de Maastricht - um ano depois o referendo foi repetido e os dinamarqueses disseram Sim; a Irlanda do Norte disse Não em 2001 - em 2002 o referendo foi repetido e venceu o Sim; em todos os países em que houve referendos sobre questões europeias, desde que foi dito o Sim, nenhum referendo foi repetido. Nos casos em os eleitores disseram Não e em que não houve repetição foi porque houve alteração da designação do objecto do referendo (a "constituição europeia" passou a designar-se Trado de Lisboa) e foram criados argumentos para dispensar o referendo.

Não vale a pena antecipar resultados. Os eleitores do Reino Unido vão decidir, mas o pânico que está instalado já deve ter dado origem a um plano B que tente manter Londres e associados na esfera de Bruxelas. Não seria uma supresa que no day after a um eventual Não dos britânicos, acordássemos com as bolsas em queda, com os mercados nervosos, com os investidores a fugirem, com as taxas de juro em alta, com o Euro e a Libra a caírem, com a perspectiva de desemprego a subir, etc, etc.. O papão do costume para assustar o povo. As televisões podem compor o ramalhete com imenso gráficos a ilustrarem o desastre em que se vai transformar a nossa vida se a União ficar reduzida a 27. Depois de umas semanas com este tipo de tratamento poderá então ser anunciado um segundo referendo para o Reino Unido se redimir e no qual os eleitores vão mostrar o arrependimento devido. 

Claro que isto é apenas a teoria da conspiração...

Pinhal Novo, 17 de Junho de 2016
josé manuel rosendo