(A ilustração é de Arend van Dam e foi publicada em www.voxeurop.eu a partir de um artigo do Le Fígaro)
Referendo no Reino Unido a 23 de Junho. David Cameron tem os calos apertados. O primeiro-ministro britânico calçou uma bota que nunca pensou lhe viesse a dificultar tanto a caminhada. Em plena campanha eleitoral na Primavera de 2015, Cameron decidiu calar a oposição interna, principalmente os eurocépticos, prometendo um referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia. Logo depois de eleito, com uma maioria absoluta do Partido Conservador, David Cameron apressou-se a dizer que a promessa era para cumprir. Honra lhe seja feita, porque cumprir o prometido é coisa cada vez mais rara nos tempos que correm.
Até em Portugal, tivemos um Primeiro-ministro que prometeu um referendo ao então Tratado Constitucional da União Europeia. Sucede que França e Holanda anteciparam-se rejeitando o Tratado através de referendos. O Tratado Constitucional passou então a Tratado de Lisboa. O Primeiro-ministro passou então a defender que ninguém deveria coloccar em causa a legitimidade do Parlamento para ratificar o Tratado. Estava em causa a palavra de um Primeiro-ministro mas o referendo foi mandado às urtigas. Porreiro, pá! Os portugueses continuaram numa União em que ninguém lhes pergunta rigorosamente nada.
No Reino Unido, ao que parece, ainda há quem tenha vergonha de dar a palavra num compromisso e depos fazer três piruetas para mudar de rumo. É a vida. E o referendo vai mesmo realizar-se.
Independentemente do resultado - quer o Reino Unido fique ou não na União Europeia - pode ser (deveria ser...) uma oportunidade para repensar a União Europeia. O beco a que chegou é fruto de políticas erradas e mais becos estão à vista se não arrepiar caminho. As crises nos 28 são um sintoma óbvio da doença. O problema é que aqueles que conduziram a Europa por este caminho defendem precisamente este caminho. Pensar que as crises lhes vão ensinar alguma coisa é pura ilusão. A União Europeia tem sido construída sem uma base popular de apoio e essa é a sua maior fragilidade.
Assim sendo, não supreenderia que, perante as sondagens a darem uma maioria favorável à saída do Reino Unido da União Europeia, já esteja a ser pensada uma repetição do referendo. A estratégia não seria novidade. Em 1992, os dinamarqueses disseram Não ao Tratado de Maastricht - um ano depois o referendo foi repetido e os dinamarqueses disseram Sim; a Irlanda do Norte disse Não em 2001 - em 2002 o referendo foi repetido e venceu o Sim; em todos os países em que houve referendos sobre questões europeias, desde que foi dito o Sim, nenhum referendo foi repetido. Nos casos em os eleitores disseram Não e em que não houve repetição foi porque houve alteração da designação do objecto do referendo (a "constituição europeia" passou a designar-se Trado de Lisboa) e foram criados argumentos para dispensar o referendo.
Não vale a pena antecipar resultados. Os eleitores do Reino Unido vão decidir, mas o pânico que está instalado já deve ter dado origem a um plano B que tente manter Londres e associados na esfera de Bruxelas. Não seria uma supresa que no day after a um eventual Não dos britânicos, acordássemos com as bolsas em queda, com os mercados nervosos, com os investidores a fugirem, com as taxas de juro em alta, com o Euro e a Libra a caírem, com a perspectiva de desemprego a subir, etc, etc.. O papão do costume para assustar o povo. As televisões podem compor o ramalhete com imenso gráficos a ilustrarem o desastre em que se vai transformar a nossa vida se a União ficar reduzida a 27. Depois de umas semanas com este tipo de tratamento poderá então ser anunciado um segundo referendo para o Reino Unido se redimir e no qual os eleitores vão mostrar o arrependimento devido.
Claro que isto é apenas a teoria da conspiração...
Pinhal Novo, 17 de Junho de 2016
josé manuel rosendo
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