Há muitas formas de abordar o que aconteceu esta
terça-feira em Bruxelas. Podemos optar pelas mais sérias e consequentes ou
pelas mais fáceis e populistas. Começando por estas últimas, que se despacham
mais depressa, coloca-se mais polícia na rua, investe-se em novos equipamentos
para controlo das entradas de locais estratégicos, reforçam-se os anéis de segurança,
e vamos todos para as redes sociais chamar nomes aos autores dos atentados.
Podemos
juntar a esta abordagem o habitual descarregar de bombas contra os locais onde
estarão os núcleos duros das organizações a que pertencem os autores dos
atentados. Como consequência inevitável teremos mais danos colaterais e mais
gente a odiar o Ocidente. Desabafamos, bombardeamos – saciando a sede de
vingança – ficamos com a ilusão de uma segurança reforçada e o tempo
encarregar-se-à de diluir a memória do que aconteceu. Até ao próximo atentado.
Se optarmos por uma abordagem mais séria, dá mais
trabalho, exige leituras mais informadas e demora mais tempo. E, ainda assim, só
o tempo dirá da sua eficácia. Exige, portanto, paciência. Algo que só uma
sociedade mais educada e informada terá – paciência – para poder esperar pelo
resultado.
Dentro desta abordagem mais séria convém, desde
logo, rever a lista de algumas amizades, como por exemplo a da Arábia Saudita,
país de onde parte uma fatia muito considerável do financiamento aos grupos islamistas
mais radicais. Depois, convirá perceber as rotas do armamento que chega à
organização Estado Islâmico e também as rotas da venda de petróleo. Quem vende
armas ao Estado Islâmico? Quem compra petróleo ao Estado Islâmico? Armas e
dinheiro. Não há organização que resista se o fluxo destes dois bens for
cortado.
Em termos políticos e diplomáticos há outras
abordagens possíveis. E muito mais complexas. Desde logo, atendendo ao ódio e à
guerra sunitas/xiitas, devemos, neste momento colocar a questão: faz sentido admitir
a criação de um “Sunistão” nos actuais territórios do Estado Islâmico, ou em
fronteiras a definir? Não adianta iludir a questão: o Iraque e a Síria, tais
como os conhecemos no último século, com as fronteiras ditadas pelo acordo
Sykes-Picot, parecem estar condenados. Será preciso depois acomodar xiitas no
Iraque, alauítas na Síria, e curdos na Síria (sendo que no Iraque, Turquia e
Irão, a questão curda também se coloca). De caminho será absolutamente
indispensável resolver a questão do Estado da Palestina.
Considerando tudo isto falta saber se a organização
Estado Islâmico está disposta a conversar. É impossível para já dar uma
resposta a esta questão, mas há sempre uma porta pela qual a diplomacia pode tentar
entrar. Podemos pensar que o diálogo com uma organização pródiga em selvajarias
é algo inaceitável, mas ao mesmo tempo devemos reter que até o Estado Islâmico
pode mudar se, por exemplo, os sunitas que nele se acolhem por falta de
alternativa, perceberem que existe a possibilidade de terem o seu próprio
território.
Estamos a falar de um redesenho das fronteiras do
Médio Oriente, algo que muitos já perceberam ser inevitável e que convém
encarar de uma forma muito séria, sob pena de estarmos perante um ciclo de
violência que nos vai colocar rotineiramente num debate inconsequente após cada
atentado.
Esta é a abordagem que me parece mais séria. Dirão que
é complexa, que é impossível e que é utópica. Talvez. É também uma abordagem
que, para além de mexer com os actuais interesses nos territórios em causa, mexe também com os interesses das potências internacionais nesses territórios. Resta tentar.
Pinhal Novo, 22 de Março de 2016
josé manuel rosendo
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