Uma vida digna é indissociável de uma morte digna. Tenho por
adquirido que um ser humano normal, sem sonhos exacerbados de riqueza material
ou, no extremo oposto, de eremita completamente despojado, apenas pretende uma
vida digna com felicidade quanto baste. Não é caso para dizer que um ser humano
assim é um “poucochinho da vida”; talvez seja alguém que apenas quer a base
indispensável para ser, em pleno, um ser humano.
Quem quer uma vida com esta base indispensável, digo eu,
está disponível para aceitar a indispensabilidade da dignidade do outro. E a
dignidade humana, como sabemos, está muito para além da satisfação das
necessidades básicas resumidas em comida na mesa e um sítio para dormir. Não há
dignidade quando se fecha os olhos à indignidade que eventualmente se nos
atravesse no caminho. Não há dignidade em exigir ao outro que sofra quando a
esperança de cura não existe.
Sobre o que diz ou omite a Constituição relativamente à vida
como um direito inviolável, não vem ao caso. É certo que vai ser necessário
legislar, mas estamos no campo da ética: os valores, normas e princípios que
cada um de nós tem como certos. O respeito pelos direitos e dignidade do outro
não podem deixar de ser obrigatórios neste “pacote” que a consciência
individual determina.
A prova de que estamos claramente a tratar de uma matéria
que ultrapassa a mera política partidária é que o manifesto recentemente
publicado em defesa da morte assistida recolheu assinaturas de figuras públicas
de muitas e diferentes áreas da sociedade e até do espaço partidário. Assim os
partidos políticos com responsabilidade de legislar entendam que não há espaço
para jogatanas de hemiciclo.
Se chegar a uma situação de grande sofrimento e sem
esperança de cura, quero ter a possibilidade de decidir sobre a minha vida. Viver
com dignidade abrange a última etapa: morrer com dignidade. Quem se arroga a
ter o direito de me negar esse direito? Por isso considero que a dignidade não
se referenda. É indispensável entre seres humanos bem-intencionados e não
engajados com outros interesses a não ser com a própria dignidade. Ser digno
implica não beliscar a dignidade do outro. Posso não
vir a ter necessidade de recorrer à Eutanásia, ou simplesmente não querer, mas
não posso recusar esse direito ao outro.
Pinhal Novo, 10 de Fevereiro de 2016
josé manuel rosendo
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