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terça-feira, 18 de julho de 2017

Temos o direito de saber se alguém alertou para as insuficiências do SIRESP, quando o fez e que resposta obteve.


Portugal continua a arder. Arde ano após ano. De há muitos anos que há um “jogo do empurra” entre políticos. Mudanças? ZERO. O país continua a arder. Ninguém assume a responsabilidade. Não é de hoje, nem do ano passado, nem de há dois anos...

Mas apenas agora se fala do SIRESP. Porque falhou em Pedrógão e voltou a falhar agora em Alijó. Já se falava do SIRESP, mas apenas do negócio e da PPP que o caracteriza. Trocaram-se críticas e argumentos mas apenas por interesses relacionados com o negócio. Nunca, pelo menos com a actual intensidade, por causa da capacidade de resposta do SIRESP. O problema é que desta vez, infelizmente, morreram 64 pessoas e já não é possível continuar a fechar os olhos e fazer de conta que o problema não existe.

Jaime Marta Soares, presidente da Liga de Bombeiros, disse (17 de Julho à noite na RTP3) que o contrato existente com o SIRESP não pode dar resposta a situações como os incêndios de Pedrógão Grande e Góis. Citou os responsáveis do próprio SIRESP numa reunião recente para acrescentar que o sistema forneceu o serviço que está previsto no contrato. Questionado sobre se o Estado deve denunciar o contrato existente, Jaime Marta Soares respondeu NIM. Assim estamos.

Fernando Curto, presidente da Associação Nacional de Bombeiros Profissionais, citado pela Revista Sábado diz que a lacuna das comunicações já vem de há anos.

Basta falar com alguns bombeiros ou agentes da protecção civil para verificar que de há muitos anos a esta parte se fala nas dificuldades de comunicação.

Para nos situarmos, sem demagogia nem oportunismo, convém sublinhar que nas competências da Protecção Civil Nacional consta a adopção de “mecanismos de colaboração institucional entre todos os organismos e serviços com responsabilidades no domínio da protecção civil, bem como formas de coordenação técnica e operacional da actividade (...)”. Este é o primeiro aspecto a ter em conta.

Depois, a ter em conta também a própria constituição da Comissão Nacional de Protecção Civil, que é presidida pelo Ministro da Administração Interna ( alista é longa mas peço a paciência de quem lê este texto):
- delegados dos ministros das áreas da Defesa, Justiça, Ambiente, Economia, Agricultura e Florestas, Obras Públicas, Transportes, Comunicações, Segurança Social, Saúde e Investigação Científica;
- presidente da ANPC;
- representantes das Associações Nacionais de Municípios e de Freguesias;
- representantes da Liga dos Bombeiros e da Associação Nacional de Bombeiros Profissionais;
- representantes do Estado-Maior-General das Forças Armadas, GNR, PSP, PJ, Gabinete Coordenador de Segurança, Autoridade Marítima, Autoridade Aeronáutica e INEM. Os Governos Regionais também podem participar nas reuniões da CNPC.

Perante este quadro, com tantas pessoas e instituições envolvidas, o que seria mesmo interessante saber é se alguma destas pessoas/instituições alguma vez fez chegar a uma destas reuniões um relatório/alerta/comunicação/estudo, seja o que for; se alguns dos representantes dos operacionais alguma vez, de alguma forma comunicou ao poder político as dificuldades de comunicações através do SIRESP. É isto que neste momento é importante saber, e saber com rigor. Custa admitir que entre tantas pessoas e instituições, nenhuma delas tenha tido a percepção de que o SIRESP podia dar mau resultado.

Sobre os problemas do SIRESP, que são conhecidos e assumidos, é importante saber se o poder político tinha conhecimento; quando teve conhecimento; que falhas foram referidas; quem as referiu; quem foi (se foi) directamente informado destes problemas; que tipo de consequências estavam previstas (se é que estavam); que respostas foram dadas pelo poder político. É o momento de colocar tudo cá fora. Bombeiros, GNR, PSP, INEM, Forças Armadas, autarcas, todos têm um dever para com os cidadãos que é suposto protegerem e essa protecção deve e pode passar por não deixar propagar a mentira e a desinformação. Digam agora que alertas fizeram sobre as insuficiências do SIRESP. Têm esse dever.

O Primeiro-Ministro disse esta segunda-feira que há relatórios de 2014 que apontaram deficiências do SIRESP. Se disse, alguma coisa deve saber. Ou então alguém terá de o desmentir.

Mas se há coisas que cansam é a guerra política e o aproveitamento da tragédia sem que ninguém assuma responsabilidades.

Pinhal Novo, 18 de Julho de 2017
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josé manuel rosendo

terça-feira, 11 de julho de 2017

Os ensinamentos de Pedrógão e de Tancos

                                   Foto: Pedro Sá Guerra, arredores de Pedrógão Grande.


O preço é demasiado elevado, eu sei, mas da tragédia de Pedrógão e da vergonha de Tancos, resulta pelo menos uma virtude: afinal, o Estado faz falta.
Não teria sido necessário morrerem 64 pessoas nos incêndios e assistirmos à vergonha de um Exército a quem roubam as armas, para chegarmos à conclusão de que o Estado faz mesmo falta, embora infelizmente haja quem não consiga aprender de outra forma.

Tivemos também, mais uma vez, a prova-provada de que as Parcerias Público-Privadas (PPP) são caminho certo para o abismo, campo fértil para o passa-culpas e, claro, para os cidadãos pagarem algo que não lhes dá nada em troca.

Em Pedrógão Grande o SIRESP falhou, o que não é o mesmo que dizer que se não tivesse falhado não teriam morrido 64 pessoas. Relacionar as duas coisas só pode ser baixa política porque nunca se saberá, nem haverá forma de provar, que as 64 pessoas teriam sido salvas se o SIRESP funcionasse sem falhas. É certo que o SIRESP falhou e não são necessários mais relatórios para sabermos que falhou. E o SIRESP, quanto mais não seja pelo preço que pagamos, não pode falhar quando faz mais falta. O SIRESP, com o longo historial que lhe conhecemos, fazendo parte das famigeradas PPP, deve regressar rapidamente à esfera do Estado para que o poder político possa ser directa e democraticamente responsabilizado pelo seu funcionamento.

Quanto a Tancos e ao roubo de material militar, a história tresanda por todos os poros. Isto é, falta saber quase tudo. De concreto, e de fonte oficial, sabemos que o material foi roubado e que o sistema de videovigilância estava avariado há vários anos. Há alguns dias, na Antena 1, o General Garcia Leandro resumiu o problema de uma forma muito clara: se o poder político estava informado dos problemas de segurança na base de Tancos, a responsabilidade é política; se não tinha essa informação, a responsabilidade é dos militares. Isto, claro, se o roubo do material militar foi mesmo como parece (porque ainda não sabemos de facto como foi): alguém, de fora, que naquele dia concretizou o roubo.

Independentemente dos pormenores relativamente aos dois casos e das eventuais responsabilidades políticas, o que estes dois casos mostram é uma fragilidade do Estado em duas áreas em que isso não pode acontecer: Defesa e Administração Interna, precisamente duas áreas onde a função de Soberania está mais à flor da pele.

Dito isto, parece-me que muitos de nós (uma maioria?) interiorizaram a falta que o Estado faz. Falta agora saber se, querendo um Estado que não falhe nas duas áreas em causa, estamos dispostos a pagar para que o Estado não falhe. Se dúvidas houvesse, um Estado não é uma entidade abstracta, e custa dinheiro. Aliás, tal como a democracia: custa dinheiro.

Também é necessário tentar perceber por que é que o Estado está fraco. Cada um que encontre a resposta que mais lhe agrade, mas os anos mais recentes deram-nos exemplos mais do que suficientes para percebermos como se dá cabo de um Estado. E a quem andou a espatifar o Estado, querendo reduzi-lo - quase conseguindo - a um Governo que assinasse cheques para os privados fazerem o que ao Estado compete, apenas se pede que tenha o pudor de guardar silêncio, quanto mais não seja por respeito aos que têm alguma memória e pensam no bem comum em vez de pensarem em benefícios privados.

Talvez agora alguns entendam melhor o ex-Presidente da República, Jorge Sampaio, quando afirmou que "há mais vida para além do Orçamento". Não se referia apenas a isto, mas também a isto. Não precisamos de um Estado “forte” no sentido policial ou de castração da sociedade enquanto colectivo dinâmico, vivo e actuante; precisamos de um Estado forte, competente e eficaz na protecção do país e do povo.

Pinhal Novo, 11 de Julho de 2017

josé manuel rosendo