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quinta-feira, 17 de março de 2016

Curdos da Síria avançam para a autonomia…


Os curdos estão em contra-relógio. Sem lugar à mesa nas negociações que decorrem em Genebra (por vontade da Turquia e contra a vontade da Rússia e, até, dos Estados Unidos), os curdos da Síria estabeleceram outras prioridades e tentam aproveitar o tempo e o contexto. A ausência de uma autoridade central na Síria, ou a sua absoluta debilidade, dá aos curdos a oportunidade que há tanto esperavam.

Esta quarta-feira, em Rmeilane, na província de Hassakeh, cerca de 150 representantes de partidos curdos, árabes e assírios, estiveram (e vão continuar) reunidos para definir as bases de um novo sistema de governo para o norte da Síria (a zona curda), entenda-se bases de administração autónoma curda. Para além dos cantões (províncias) de Afrin, Kobani e Jazeera, os curdos conquistaram território ao Estado Islâmico e pretendem agora unificar todo o território que controlam para exercer sobre ele uma administração que seja autónoma de Damasco. Um projecto de declaração já conhecido e que deverá ser divulgado esta quinta-feira, 17 de Fevereiro, refere que uma federação democrática será a única solução para garantir os direitos de todos os indivíduos. Paralelamente a este grito de autonomia, os delegados dizem que este primeiro passo não é um passo em direcção à independência, mas pode ser um exemplo para todo o território sírio.

Já se sabe que a Turquia não quer nem ouvir falar em autonomias curdas e não será de estranhar que um qualquer argumento justifique novos ataques curdos a zonas controladas pelas Unidades (curdas) de Protecção popular (YPG), o braço armado do Partido da União Democrática (PYD), que considera “terroristas”.
A reunião de curdos da Síria e o resultado esperado pode ser visto também como um aviso aos que estão em Genebra a negociar: é preciso contar com os curdos e eles estão dispostos a não deixar isso em mão alheias.

Os curdos controlam cerca de 10% do território sírio e cerca de 75% da fronteira sírio-turca e já falam abertamente de uma solução federal. Em Genebra Turquia e Síria já rejeitaram a ideia. O regime sírio responde que isso será um fracasso absoluto e vai provocar divisões entre os sírios; aTurquia concorda (porque tudo o que é bom para os curdos é mau para a Turquia) e já disse que considera a ideia inaceitável. 

Seja como for, considerados pelos Estados Unidos como a força mais eficaz no combate ao Estado Islâmico, os curdos apresentam agora a factura dessa luta que travou o avanço dos fundamentalistas: querem administrar o seu próprio território.

Pinhal Novo, 16 de Março de 2016

josé manuel rosendo

sábado, 20 de fevereiro de 2016

(Talvez) A hora dos curdos da Síria


E chegámos ao momento de saber quem é terrorista! Expressão máxima e mais recente desta questão é a de saber se as Unidades de Protecção Popular (YPG, braço militar do Partido da União Democrática – PYD – dos curdos da Síria) são terroristas. As YPG combatem o Estado Islâmico e (só às vezes) as forças do Exército Livre da Síria (oposição “moderada” a Bashar al Assad), com quem também já combateram lado a lado. O que as YPG pretendem é tão só expandir território e conquistar autonomia para esse território. É esse o objectivo dos curdos no Iraque e na Síria. Aliás, o Presidente do Curdistão Iraquiano, Massoud Barzani, disse recentemente que o tempo do acordo Sykes-Picot (que, há precisamente 100 anos, dividiu os territórios do antigo Império Otomano e deixou os curdos à espera de um Estado…) terminou. Barzani dirigiu-se aos líderes mundiais e disse algo muito simples: independentemente do que digam e de aceitarem ou não, é esta a realidade no terreno! E esta é talvez a mais complicada questão que se coloca na região logo a seguir ao Estado Islâmico. Uma questão que deixa a Turquia irritadíssima.

Depois do atentado (28 mortos) de 17 de Fevereiro em Ankara, a Turquia apontou baterias aos curdos. O PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão) foi acusado da autoria do atentado, tal como as YPG. Ambos negaram, mas dois dias depois os Falcões da Liberdade do Curdistão, grupo próximo do PKK, reivindicaram esse atentado feito na via pública mas que visou viaturas militares. O argumento foi o de ser uma resposta à actuação das forças militares turcas na região de Cizré (Curdistão turco) onde muitos curdos têm sido mortos.

É com este cenário que a Turquia intensifica os bombardeamentos da artilharia contra a região curda da Síria. E é com este argumento que a Turquia tenta convencer os aliados ocidentais de que é necessária um intervenção militar terrestre no norte da Síria. O problema é que para os Estados Unidos as YPG não têm o carimbo de “terroristas” e têm demonstrado ser uma força importante na contenção do Estado Islâmico. Por outro lado, as YPG e outras forças curdas aliaram-se com várias tribos sunitas do norte da Síria e formaram em Outubro passado as Forças Democráticas da Síria que têm sido apoiadas pelos bombardeamentos aéreos dos Estados Unidos no combate ao Estado Islâmico e na consequente expansão territorial.

Temos pois um problema que assenta numa velha questão: os que são terroristas para uns, são combatentes da liberdade para outros. Sempre assim foi e dificilmente deixará de ser. Saber quem deve ser colocado na lista de “terroristas” é também o que está a entravar as negociações de Genebra sobre a guerra na Síria, suspensas a 3 de Fevereiro e com recomeço previsto para 25 de Fevereiro.

Esta sexta-feira (19), houve uma declaração que passou sem a devida atenção: o Embaixador russo nas Nações Unidas, Vitail Tchourkine avisou o Presidente sírio Bashar al Assad contra a intenção declarada de reconquistar todo o território sírio num momento em que a diplomacia fala da necessidade de um cessar-fogo. Como se sabe a Rússia também apoia as YPG e não foi por acaso que os curdos da Síria abriram uma representação em Moscovo. Pode ser que esteja a chegar a hora dos curdos da Síria.

Pinhal Novo, 20 de Fevereiro de 2016

josé manuel rosendo 

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

O Dilema da NATO: apoiar os curdos ou a Turquia?

                                O Rio Eufrates separa a província de Kobani da de Afrin. É a
                                de Afrin que a Turquia não quer permitir que seja controlada 
                                pelos curdos das Unidades de Protecção Popular mesmo que
                                esteja lá o Estado Islâmico (foto Outubro de 2015)


A Turquia pode não estar a ganhar a guerra, mas está a marcar pontos onde mais directamente lhe interessa: está a bombardear os curdos, no caso os curdos da Síria! É certo que é uma estratégia de curto prazo, mas retardar qualquer ganho territorial ou acréscimo de autonomia curda é algo que sempre agrada a Ankara. Não deixa de ser curioso que a Turquia nunca tenha ameaçado uma intervenção militar na Síria para enfrentar e combater o Estado Islâmico, mas que o faça agora (tal como a Arábia Saudita) perante o avanço curdo que tenta criar uma continuidade territorial junto à fronteira com a Turquia, ligando as províncias de Jazira e Kobani a Afrin (até agora controlada pelo Estado Islâmico, não se sabendo exactamente qual é o poder dos extremistas nesta região). 

Há três dias que Turquia bombardeia posições curdas na província de Afrin, onde, diga-se também existiam bolsas controladas pelo Exército Livre da Síria (oposição considerada moderada). A situação é extremamente confusa com bombardeamentos que atingem escolas e hospitais, matando quase exclusivamente civis e provocando uma troca de acusações entre Estados Unidos, Rússia, Turquia, curdos e restantes intervenientes.

Relativamente à questão curda, convém reter que os curdos da Síria combateram ferozmente contra o Estado Islâmico e, ajudados pelos bombardeamentos aéreos norte-americanos, expulsaram os extremistas, empurrando-os para sul e para oeste, obrigando-os a atravessar o Rio Eufrates para a província de Afrin, onde agora decorrem os combates dos últimos dias. As milícias curdas das Unidades de Protecção Popular (YPG), braço armado do Partido da União Democrática (PYD), combateram sempre contra o Estado Islâmico. Umas vezes ao lado do Exército Livre da Síria, mas também contra este ramo da oposição quando se tratou de conquistar terreno para os curdos. Logo após o início da revolta contra o Presidente Bashar al Assad, os curdos preferiram uma espécie de neutralidade tentando tirar partido da luta que desgastava o poder sírio, espreitando uma oportunidade de alargar território e ganhar autonomia – a exemplo do que acontece com os curdos no Iraque.

Não deixa de ser irónico que o avanço curdo acabe por beneficiar o regime de Bashar al Assad, sendo que a aparente expansão do controlo curdo no norte da Síria não teria acontecido se não tivesse acontecido a revolta contra o regime sírio. Nos combates que decorrem neste momento, os curdos não estão alinhados nem com o regime de Assad, nem com os rebeldes considerados moderados, e ainda menos com o Estado islâmico ou com as diversas milícias islâmicas. 

Para a Turquia, o avanço curdo é o pior dos resultados nesta guerra na Síria. A Turquia regista a vantagem que Assad (e também a Rússia e o Irão) retira da luta curda e sabe que atingindo os curdos está a atingir Assad, a Rússia e o Irão. Os turcos olham o PYD como aliados do PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão) e classificam os dois como organizações terroristas. Este é o ponto em que os aliados NATO (Turquia e os países ocidentais) divergem: o ocidente (que não se cansa de repetir que não quer colocar botas – homens – no terreno) vê os curdos como os mais capazes para combater o Estado Islâmico. Falta saber como é que a NATO vai resolver este dilema.

Curiosamente, quase que se deixou de ouvir falar de Estado Islâmico… parece ter cumprido a sua primeira missão: servir de argumento para um confronto entre potências regionais e entre as outras, as habituais, Estados Unidos e Rússia.

Pinhal Novo, 16 de Fevereiro de 2016

josé manuel rosendo