segunda-feira, 10 de outubro de 2016

A balda dos táxis num país de “uber's" à balda


A foto que ilustra este texto foi feita por mim, em Abril de 2015. Chegado à estação de Campanhã, no Porto, entrei no primeiro táxi da fila – tem de ser assim - e, já lá dentro, deparo-me com este cenário: um pára-brisas estilhaçado! O táxi era velho e revelho, as mudanças entravam a “pontapé” e o motorista, coitado, muito mais velho do que o táxi, já merecia estar a gozar a reforma. Se juntarmos a este exemplo a manifestação/protesto desta segunda-feira (10 de Outubro) e as imagens de verdadeiros arruaceiros que os taxistas transmitiram ao país, podemos dizer que o sector está a precisar de uma enorme reciclagem. Isto para dizer que apesar deste mau serviço e destes maus exemplos considero que o que estão a fazer aos taxistas – aos profissionais dignos – é uma verdadeira “filha da putice”.

Num Estado de Direito Democrático (EDM) não parece defensável pretender manter uma actividade económica sem que esteja regulamentada (uber e cabify); num EDM não parece defensável ter regras diferentes para vários agentes económicos que concorrem na mesma área de negócio; num EDM alguém que inicie uma actividade económica sem enquadramento legal deve ser devidamente punido.

O que está em causa (táxis versus uber/cabify) não são novas tecnologias – as tais plataformas; não está em causa um novo serviço; ninguém descobriu a pólvora. O que está em causa é que uns quantos xico-espertos descobriram uma brecha na legislação - e tiveram cobertura política para crescer e apresentarem-se agora com um facto consumado - que tentam explorar, e consideram-se “muito à frente”; o que está também em causa são empresas de táxis que pararam no tempo e quiseram, num determinado momento, reduzir custos à conta de biscateiros mal preparados que não têm nenhum tipo de preocupação com o futuro da actividade a não ser receber o trabalho feito durante algumas horas depois do turno de trabalho normal na empresa onde realmente trabalham (todos conhecemos alguém que após um horário normal de trabalho entra(va) num táxi para fazer umas horas e aconchegar o orçamento); o que está em causa é taxistas sem brio profissional (sim, sem brio profissional: alguns são mal educados, alguns cheiram mal, usam camisas surradas, fumam dentro dos táxis): E que as empresas de táxis não venham acusar a uber de utilizar trabalho precário – o que é verdade – porque fazem (ou pelo menos já fizeram) o mesmo. Evidentemente que também há bons profissionais, mas tudo o que atrás foi referido contribuiu para a degradação do serviço.

A desregulamentação é a menina dos olhos dos neoliberais. No caso da uber e da cabify, beneficiaram de um momento em que Portugal tinha o Governo que todos sabemos; seria um bom sinal do actual Governo combater a desregulamentação neste sector e seria um sinal de afastamento de práticas e filosofias anteriores.

Melhores serviços todos queremos, mas entrar no facilitismo de admitir a desregulamentação das actividades económicas só porque, num determinado momento, há um ganho imediato da qualidade desse serviço, é abrir a porta a uma sociedade sem regras, ao trabalho à jorna, à selva. Quem agora pensa que ganha alguma coisa com essa desregulamentação não vai demorar muito a perceber que as perdas são muito maiores a médio-longo prazo. Hoje é o sector do serviço de transporte de passageiros em veículos ligeiros, ontem já foi assim com outros sectores, amanhã será ainda com outros. O lucro desta desregulamentação nunca beneficia quem trabalha ou quem utiliza os serviços. Nunca beneficia a Sociedade no seu conjunto.

No caso de que estamos a falar, tanto se me dá que lhe chamem uber, táxi ou cabify. Gostaria de ter um serviço que me transportasse num carro limpo, de preferência com poucos anos de uso e com um motorista educado que não reclamasse quando a corrida é pequena, quando não recebe o pagamento em dinheiro trocado ou quando não recebe a esperada gorjeta. E esse serviço terá de ser regulamentado, para defesa dos profissionais e dos cidadãos que utilizam o serviço. E já agora, também é bom que se diga que os motoristas da uber/cabify nunca fazem porventura o mesmo tipo de reclamações porque podem recusar os serviços que não lhes interessam. Os taxistas não o podem fazer.

Pinhal Novo, 10 de Outubro de 2016

josé manuel rosendo

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