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quinta-feira, 13 de julho de 2017

CTT... de cavalo para burro


Os CTT ilustram de forma perfeita a bagunça para a qual Portugal resvalou. Vamos aos CTT para enviar uma carta registada ou levantar uma encomenda postal que não cabia na caixa de correio e deparamos com uma verdadeira “loja do chinês” ou “dos trezentos”: para além do serviço de correios propriamente dito, vende CD’s, livros, bilhetes para espectáculos e telemóveis... também há seguros e, claro, um Banco. Certamente haverá outros exemplos, mas onde vivo por aí se fica. Comprar um selo pode significar ter de esperar que alguém escolha o modelo de telemóvel, ou o livro, que pretende comprar. É difícil imaginar um trabalhador que tem de passar do aconselhamento na compra de um telemóvel, para uma eventual indecisão entre um livro de José Saramago e outro de Mia Couto, e depois ter de registar uma encomenda postal para Bissau ou Nova Iorque. Habitualmente, também, as máquinas automáticas de venda de selos, não têm trocos... Resultado? Quem vai aos CTT sujeita-se a um tempo de espera inaceitável. Está muito claro que os CTT em vez de servirem os utentes do serviço que prestam, servem-se dos utentes, fazendo-os esperar, porque essa é a melhor forma de manter os trabalhadores permanentemente ocupados retirando deles o maior rendimento possível. Se o serviço que os CTT nos prestam tem um preço, e nós pagamos por esse serviço, também o tempo dos clientes tem um preço e os CTT não podem sequer admitir ter os clientes à espera até ao momento que a empresa decida ser o mais conveniente para o atendimento.

Da mesma forma que o transporte aéreo (pelo menos na União Europeia) já regulamentou as compensações que as companhias aéreas estão obrigadas a pagar em caso de atrasos nos voos (em função do tempo de atraso e do destino), também os CTT e outras empresas prestadoras de serviços, deveriam ser obrigadas a indemnizar os utentes e clientes sempre que estes são forçados a esperar um tempo para além do razoável. Aliás, é fácil saber o tempo de espera porque as senhas de atendimento têm a hora a que são emitidas (e se em alguns casos isso não acontece é fácil fazer a alteração). Depois, é apenas verificar a hora a que o atendimento é concretizado. Essa seria uma forma de todos sermos mais respeitados por uma série de empresas e serviços que abusam da posição que ocupam no mercado.

Ainda quanto aos CTT, sobre a distribuição postal nem vale a pena falar. Já todos, ou quase, percebemos que o carteiro agora toca duas vezes, mas é por semana. E é quando é. Eis senhoras e senhores o resultado da privatização; há accionistas que recebem dividendos, sendo que nós recebemos um serviço cada vez pior.

A venda dos CTT, pormenores do negócio à parte, ilustra a visão que alguns têm do Estado e do que o Estado deve ser. Mas, mesmo sendo os CTT uma empresa agora privada, ali para os lados de São Bento (em Lisboa) deveria haver alguém a pensar nesta questão: como é que as empresas podem ser obrigadas (sim, obrigadas) a respeitar quem a elas recorre (e paga por isso). Todos ficaríamos gratos.

Pinhal Novo, 13 de Julho de 2017
josé manuel rosendo

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Marcha fúnebre

São cada vez menos as Empresas Públicas mas ainda são suficientes para percebermos que a asneira vai continuar até à extinção. Há uma longa história de transferências de gestores do sector privado para o público e vice-versa. Muitos deles dizem cobras e lagartos do sector público enquanto são muito bem pagos no sector privado. Quando seca a virtuosa teta privada e outra alternativa não vislumbram, rapidamente fazem agulha para o desgraçado sector público, qual apaixonados a quem o feio sempre parece bonito. No sentido oposto viajam os que serviram determinado poder político e são depois devidamente compensados no sector privado. São gestores, e pronto. Podem gerir tudo. Não importa se conhecem o sector público para onde são chamados a espalhar sabedoria e executar um qualquer objectivo político; não importa se conhecem o sector privado onde a recompensa os espera. Muito menos importa se conhecem a empresa em causa. Afinal por que haveria de importar? Uma pessoa inteligente aprende e adapta-se. Há excepções? Admito que sim, mas são isso mesmo: excepções.

Estes dançarinos da gestão, podem sair das cervejas para a comunicação social; da saúde para a banca; dos azeites para as infra-estruturas… E se calhar até têm razão: gerem tudo da mesma forma. Afinal qual é a diferença entre um estúdio de rádio ou televisão e uma central de cervejas? qual é a diferença entre um serviço de urgência de um hospital e um balcão de uma instituição bancária?, qual é a diferença entre uma fanga de azeitona e a antiga Estrada Nacional 2? Não há diferença porque em geral (no público) é preciso cortar na despesa com pessoal, na manutenção, no investimento, na inovação e por aí fora... Cortar é cortar. É olhar para o orçamento e abater a percentagem que alguém determinou. O resto, que façam os que lá trabalham, porque é para isso que são pagos. E se no público houver algo com perspectiva de passar a ser privado, ainda melhor. Talvez no futuro haja um lugarzinho.

A frequente chegada ao sector público de gestores formados no sector privado só pode resultar no desastre a que temos assistido nas últimas décadas. Chegam ao sector público e gerem da mesma forma que geriam no privado. Serviço Público? O que é isso? O que é preciso é pôr as empresas a dar lucro ou acabar com o “prejuízo”. Gostam sempre de falar naquela curiosa teoria que compara as empresas públicas (às privadas e) a um orçamento familiar. É assim que pensam. É assim que fazem. Contam, habitualmente, com equipas de “yes-man” que dizem que sim aos senhores administradores e a todos tratam por “senhor doutor” ou “senhora doutora”. Seja qual for a administração, eles lá estão, dispostos a acenar a cabeça em sinal de aprovação, mesmo que isso signifique aprovar o absurdo. É gente que chateia quem está abaixo e dobra a espinha quando fala para cima; gente que não quer chatices, mas quer manter um lugarzinho na respectiva empresa. 

Acontece que também há quem diga “não” aos “senhores doutores”. Acontece que há quem queira mesmo as empresas públicas a prestar Serviço Público. Em regra são “encostados”. Mas também há sempre alguém muito competente que as administrações conhecem do privado e que são “indispensáveis” no público. Em regra, são bem pagos e entram “por cima” com contrato blindado. Geralmente, a tutela aplaude tudo isto. Afinal, a administração (da empresa pública) é que sabe, gosta a tutela de dizer. Todos os governos gostam a determinado momento de dizer que não interferem na administração das empresas públicas. É assim uma espécie de pin que colocam na lapela. Assim estamos, assim vamos. 

Entretanto, à chegada de cada nova administração que nomeia novas direcções e respectivas cadeias de comando, é esquecida a dedicação e a competência dos que trabalham e assistem ao desfile das administrações. Cada administração que chega vem com aquela ideia da “empresa nova” (lembram-se da teoria do “homem novo”? é quase o mesmo…), o que está para trás não conta, interessa é o futuro. Como se a história das empresas e de quem nelas trabalha fosse capital a desprezar.

Misturar a gestão de génese privada com a administração das empresas públicas é quase como pretender misturar azeite com água. Enquanto em Portugal o público e o privado não estiverem em campos bem demarcados e enquanto os muitos empreendedores de quem permanentemente se anunciam os méritos continuarem a ser chamados para as empresas públicas, aplicando os métodos de gestão características das empresas privadas, o resultado vai ser mau.

Esta casta de gestores e respectivas tutelas políticas nunca irão perceber que o eventual “prejuízo” das empresas públicas pode representar enormes ganhos sociais. Ao invés, nunca irão perceber que as contas certinhas das empresas públicas podem significar enormes prejuízos para toda a sociedade e em particular para os mais desfavorecidos e para a própria democracia.

A dança de cadeiras e interesses entre o privado e o público mata o Estado e “mata-nos” a todos. E é o Estado – somos nós – quem paga. Esta dança, que não é um tango nem uma valsa, tem com certeza um andamento fúnebre. Assim será enquanto em Portugal não existir uma “escola” de Serviço Público que dê ao sector público gestores que queiram mesmo dedicar-se ao Serviço Público e não passem por ele apenas em comissão de serviço e à espera de uma qualquer chamada que os leve de novo a uma empresa privada.

Pinhal Novo, 1 de Setembro de 2016
josé manuel rosendo

sábado, 29 de dezembro de 2012

Cigarrinhos de enrolar e gestores que ganham mais de um milhão de €uros por ano.

Podia começar por dizer que a tocar o final de 2012 decidi fazer as contas do ano. Não é verdade. Confesso que já não faço contas. Simplesmente não gasto. Isto é, tenho que comer, mais algumas coisas básicas, pagar água, renda de casa, luz e electricidade, e faço uns cigarrinhos de enrolar. Ponto final.
 
Mas, chegado a casa, li nos jornais o que não tive tempo de ler durante o dia. A manchete do DN tinha ficado à espera: “30 gestores tiveram ganhos anuais acima de um milhão em 2011”. O DN acrescenta, não dizendo quem é, que um desses 30 gestores recebeu 2,7 milhões de Euros em 2011. Os números parecem insuspeitos porque fazem parte de um relatório anual produzido pela CMVM (Comissão do Mercado de Valores Mobiliários). No caso são gestores executivos de empresas cotadas.
 
Leio o artigo enquanto vejo num canal de notícias os aumentos de preços agendados para entrar em vigor a partir de 1 de Janeiro. Preços de serviços prestados por empresas, algumas delas que já foram do Estado – nossas – e pergunto-me, porque o DN não diz, se alguns destes gestores não serão destas empresas que agora vão aumentar os preços; e pergunto-me ainda qual a percentagem destes aumentos – que nós vamos pagar – que vai engordar estas e outras suculentas remunerações dos ditos gestores.
 
Com estas perguntas para as quais certamente conhecerão a resposta, dou comigo a pensar naqueles doutos economistas e políticos que, sempre que falam das empresas que são do Estado quando estas apresentam contas deficitárias – em regra os mesmos tendem a ignorar os benefícios sociais que esse défice significa – fazem logo a seguir a pergunta que o povo gosta de ouvir: quem é que paga isto? “Quem é que paga isto?”, é a frase a que aqueles que estão a receber a mensagem (provavelmente desempregados, reformados, trabalhadores a salário mínimo ou nem isso…) respondem de forma automática: somos nós! Muito provavelmente acrescentarão, dirigindo-se aos que trabalham nessas empresas públicas, uns quantos palavrões cuja intensidade dependerá de quem mais tiverem ao seu redor.
 
Esta demagogia de perguntar “quem paga?” quando se fala de empresas públicas é feita com a sugestão implícita de que nas empresas privadas não são os mesmos a pagar. Pura mentira. Quem paga os lucros dos bancos? Quem paga os lucros das seguradoras, das empresas que gerem as Auto-estradas, dos hospitais e das escolas privadas? Quem paga o gás, a electricidade, a água, os cigarros? Quem paga tudo ao fim e ao cabo? Somos nós, sempre nós. Isto é, somos nós que pagámos o tal milhão de Euros que cada um daqueles 30 gestores da manchete do DN levou para casa em 2011.
 
É um bocadinho como a história de saber quem paga a televisão e rádio públicas e as televisões e as rádios privadas. Somos sempre nós, pois quem havia de ser? Mas uma coisa é pagarmos algo que é nosso – do Estado, e assim sendo temos uma palavra a dizer – outra bem diferente é pagarmos aquilo que não é nosso e em relação ao qual não temos qualquer tipo poder.
 
josé manuel rosendo
Pinhal Novo, 28 de Dezembro de 2012