Aquando das primárias do Partido Democrata nos Estados Unidos da América,
não faltou quem defendesse que uma vitória de Bernie Sanders traduzir-se-ia
numa derrota frente a Donald Trump. A teoria assentava no pressuposto de que o
eleitorado democrata mais à direita, perante um candidato “esquerdista”,
deslocaria o voto para Trump. Até Noam Chomsky, um insuspeito académico de
esquerda, alinhou nessa teoria. Ninguém sabe se, de facto, assim seria, mas
todos sabemos o que aconteceu e quem é agora o inquilino da Casa Branca.
Podemos até dizer que entre uma direita desbocada e com o freio nos dentes e
uma outra direita mais envergonhada e com algumas boas maneiras, os
norte-americanos preferiram a primeira.
Lembrei-me deste caso a propósito das eleições presidenciais francesas,
onde as sondagens mostram quatro candidatos com possibilidades de passar à
segunda volta. E a surpresa, qual é? Chama-se Jean-Luc Mélenchon, o único
candidato de esquerda. Sim, o único, porque Benoit Hamon, por muito boas
intenções que tenha, é o candidato daquela pseudo-esquerda a que já nos
habituámos: bandeirinha de esquerda e decisões de direita (basta olhar para
François Hollande). Aliás, ainda não se percebe porque é que, lá como cá, ainda
não nasceu um “partido tangerina”. Entenda-se de cor laranja, mas com perfume
mais requintado. A rosas, por exemplo.
Dito isto, e não se sabendo quem da direita vai passar à segunda volta (até
pode ser entre dois candidatos de direita – mas admitamos que passam Le Pen e
Mélenchon), já começa a surgir uma teoria decalcada daquela que ajudou a
afastar Bernie Sanders da disputa da Casa Branca: Mélenchon não terá qualquer
possibilidade na segunda volta perante Marine Le Pen, a candidata da Frente
Nacional. Isto é, considera quem assim pensa que entre um candidato de esquerda
e uma candidata de direita, a maioria do eleitorado francês vai, por receio do "esquerdismo", dar o
voto à direita. O efeito desta teoria pode, claramente, prejudicar Mélenchon
nesta primeira volta e pode afastar da corrida o único candidato que, de facto,
tem algo de substancialmente diferente para propor aos franceses (tal como
Bernie Sanders tinha para os norte-americanos).
É certo que algumas sondagens dão Mélenchon a vencer Le Pen numa eventual
segunda volta, mas agitar papões e condicionar o voto faz parte de qualquer
campanha eleitoral. A ver vamos qual vai ser a primeira decisão dos franceses.
Dia 23 de Abril, à noite, vamos ligar a televisão (ou a rádio) e esperar. A 7
de Maio saberemos quem é o próximo Presidente francês. Em Bruxelas há velinhas
acesas para que a coisa não descambe.
Pinhal Novo, 11 de Abril de 2017
josé manuel rosendo