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Curdos sob intensa
pressão
Curdos contra
tudo e contra todos. A hora decisiva está a chegar. Na última sexta-feira, o
Parlamento do Curdistão aprovou, por votação de braço no ar, a realização de um
referendo (consultivo) sobre a independência do Curdistão a 25 de Setembro. A oposição
não participou na votação. Está previsto o referendo em três províncias
autónomas que formam o Curdistão iraquiano (Dohuk, Erbil e Sulaimaniya) e em (zonas
disputadas por curdos e pelo Governo de Bagdad) Makhmour, Khanaqin, Sinjar e
Kirkouk (zonas que chegaram a ser ocupadas pelo Estado Islâmico onde os
Peshmerga combateram e que agora controlam).
Como (quase) sempre
acontece no Médio Oriente, o xadrez político nunca é de leitura simples. Desta
vez, apesar da independência ser há muito o sonho dos curdos, este referendo é
convocado num momento em que o mandato do Presidente Massoud Barzani já
terminou em 2015 e o Parlamento foi “recuperado” após dois anos sem sessões. O Curdistão
tem, desde 1991, um estatuto de autonomia que, na prática, é uma independência
de facto (não tendo obviamente o estatuto de par entre pares na Ordem
Internacional). Barzani avança para o referendo – apesar de alguma oposição
interna – com o argumento de que não tem um parceiro em Bagdad, acusando o
governo federal de não cumprir os compromissos assumidos e de não respeitar a
Constituição iraquiana e o que ela dispõe em termos de autonomia.
Os curdos também
sabem que depois da resistência que fizeram ao Estado Islâmico – quando o
governo central de Bagdad falhou – a comunidade internacional terá poucos
argumentos para não aceitar que os curdos decidam a sua própria vida.
Após a I Guerra
Mundial, o Tratado de Sèvres previa a criação de um Estado curdo, mas os
Aliados acabaram por rever essa possibilidade. Os curdos guerrearam-se entre
eles mas também foram alvo de uma campanha assassina por parte de Saddam
Husseín. O período em que maiores ganhos registaram foi precisamente após a
queda de Saddam Husseín (2003). Talvez vejam na desintegração do Estado Islâmico
uma oportunidade de afirmação. Mas os curdos estão habituados a que os amigos
de ocasião lhes voltem as costas. Não vão longe os “aplausos” internacionais à
coragem e determinação dos curdos contra o Estado Islâmico (o que continuam a
fazer na Síria) mas não é por acaso que um velho provérbio curdo diz que “os
únicos amigos dos curdos são as montanhas”.
Não se sabe quantos eleitores estão
recenseados para este referendo. A região autónoma oficial terá cerca de 5,5
milhões de habitantes, mas serão quase 8 milhões se as outras áreas “não
oficiais”, mas reclamadas pelos curdos, também participarem. O Presidente
Massoud Barzani tem reafirmado sucessivamente que o referendo vai mesmo
realizar-se.
A ver vamos se há referendo.
As posições dos
vários actores internacionais
Iraque – Governo
central
O Parlamento
federal (depois dos deputados curdos abandonarem o debate) já votou contra a
realização do referendo e destituiu o governador de Kirkouk (que insistiu em
manter-se no cargo).
O Supremo
Tribunal ordenou a suspensão do referendo até que possa aferir da
constitucionalidade da consulta popular. A verificação da constitucionalidade
foi requerida pelo Primeiro-ministro Haider al Abadi. Alguns deputados xiitas e
turcomanos também pediram a verificação da constitucionalidade.
O importante
comandante militar xiita Hadi al Ameri, do Supremo Conselho Islâmico do Iraque,
apoiado por Teerão, já alertou para a possibilidade de guerra civil.
O vice-Presidente
e antigo Primeiro-ministro iraquiano, Nouri al Maliki, afirmou que recusa que o
Curdistão venha a ser “um segundo Israel” e alertou para consequências perigosas
se o referendo se realizar. Al Maliki argumenta que não permitirá o nascimento
de um Estado de base étnica assente num modelo semelhante ao da criação do
Estado de Israel.
ONU
O Secretário
Geral António Guterres pede paciência e contenção. Guterres alerta para a
possibilidade de o referendo prejudicar o objectivo de vencer o Estado Islâmico
e da reconstrução dos territórios reconquistados. As Nações Unidas propõem
suspender o referendo e oferecem em troca, no prazo de três anos, um acordo
entre curdos e governo federal sobre o estatuto da região autónoma. O documento
com uma proposta da ONU já chegou ao Presidente curdo e assenta em negociações
estruturadas, apoiadas e intensivas que levem a um acordo entre Erbil e Bagdad.
A ONU oferece-se como mediadora e, depois, está disponível para ajudar a
implementar as decisões.
Estados Unidos da América
Contra o
referendo. Washington avisa que o referendo será uma provocação e vai
desestabilizar a região, sendo um entrave na luta contra o Estado Islâmico. Os
Estados Unidos propõem um diálogo entre as autoridades curdas e as de Bagdad,
propondo-se também como mediadores. A Casa Branca já fez chegar ao presidente
curdo um projecto com alternativas ao referendo. Massoud Barzani ainda não
respondeu.
Turquia
É o vizinho mais
preocupado com o referendo e é frontalmente contra, apesar da boa relação
comercial com o Governo Regional do Curdistão. A uma semana da consulta popular,
Ankara anunciou exercícios militares junto à fronteira com o Iraque e já disse
várias vezes que o referendo “terá um preço”. O Presidente Recep Tayyip Erdogan
anunciou uma reunião do Conselho de Segurança turco para 22 de Setembro. Ankara
e Bagdad estão de acordo quanto à necessidade de manter o Iraque com o actual
modelo federal.
Irão
O país tem uma
importante minoria curda e tem vindo a apelar para que o Referendo não se
realize. O apoio militar do Irão aos Peshmerga foi importante na luta dos
curdos contra o Estado Islâmico. O secretário do Conselho Supremo da Segurança
Nacional do Irão avisou agora que fechará todos os postos fronteiriços com a
região curda do Iraque e todos os acordos serão anulados. Há informação de que
um comandante de uma unidade de elite dos Guardas da Revolução iranianos está
em Souleimaniya e por lá vai ficar até à data prevista para o referendo.
Israel
O
Primeiro-ministro Benjamin Netanyahu apoia a realização do referendo no
Curdistão.
Reino Unido
A posição
oficial é contra o referendo. O governo britânico defende a integridade do
Iraque. O Ministro da Defesa fez uma última tentativa junto de Massou Barzani mas segundo a Rudaw TV o Presidente curdo disse que um eventual adiamento do referendo só com garantias de independência.
França
O Governo
francês considera que o referendo é uma “iniciativa inoportuna”. O Ministro dos
Negócios Estrangeiros, Jean-Yves Le Drian, assumiu que a França está a preparar
o pós Estado Islâmico e não quer que disputas entre iraquianos prejudiquem esse
momento. A França defende a integridade territorial do Iraque e a sua dimensão
federal.
A contrariar
esta atitude do governo francês, o ex-Ministro dos Negócios Estrangeiros,
Bernard Kouchner, apoia a realização do referendo. Kouchner lembrou que todos
tiram partido dos curdos mas não querem que eles sejam independentes. “É de um
cinismo inacreditável”, afirmou Bernard Kouchner, acrescentando que é aos
curdos que compete decidir se querem ou não a independência.
União Europeia
Bruxelas
considera que a realização do referendo não é oportuna.
Pinhal Novo 19
de Setembro de 2017
josé manuel rosendo
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