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domingo, 14 de junho de 2020

O Tribunal Penal Internacional não peca por excesso, mas por defeito: a invasão do Iraque, em 2003, está por investigar e julgar.

Anciãos de aldeia nos arredores de Nassíria, Iraque, Abril 2004. Foto: jmr
Qualquer instituição internacional que tenha o atrevimento de tratar os Estados Unidos como apenas mais um país entre todos os outros, já sabe que vai ser alvo da fúria de Donald Trump. O actual inquilino da Casa Branca não esgrime argumentos, não contrapõe, não dialoga, não tenta desmontar as teses que lhe desagradam. Não! Donald Trump, ofende e ameaça quem se lhe opõe ou tem opinião contrária. E o mais grave é que tem poder para fazer o que quer.

A implícita supremacia de que o Presidente norte-americano se julga possuído – que o coloca acima da Lei e que o afasta do multilateralismo que é o concerto entre nações – dá azo a uma escalada de tensão em todos os conflitos em que se vê envolvido, com prejuízo de toda a comunidade. Quando devia ser conciliador e procurar soluções, Trump é um verdadeiro incendiário. Os únicos que gostam desta atitude são os seus eleitores que, muito provavelmente, lhe vão dar um segundo mandato presidencial.

As Administrações norte-americanas (apesar do Estatuto de Roma ter sido assinado por Bill Clinton, em 1998) sempre defenderam que os seus militares em missões externas não poderiam ser acusados de crimes de guerra. Aliás, precisamente no ano em que o Estatuto de Roma entrou em vigor (2002), George W. Bush, não se coibiu de chantagear os países que decidissem entrar para o TPI, ameaçando-os com a retirada de assistência militar norte-americana. No mesmo ano, o Congresso autorizou o Presidente a usar meios militares para libertar militares norte-americanos que viessem a estar detidos às ordens do TPI.

A mais recente investida contra uma instituição que trata os Estados Unidos tão só como par entre pares, está consubstanciada no decreto que estabelece sanções contra os Procuradores do Tribunal Penal Internacional (TPI) que se atrevam a investigar eventuais crimes de guerra que tenham sido cometidos por militares norte-americanos no Afeganistão. O TPI autorizou, no início de Março, uma investigação para apurar eventuais crimes de guerra e contra a humanidade, que tenham sido cometidos por militares norte-americanos, militares afegãos e taliban.

É certo que os Estados Unidos nunca ratificaram (apesar de inicialmente terem assinado) o Estatuto de Roma que estabelece do TPI desde 2002, mas ele existe e está ratificado por mais de 120 países, havendo outros que o assinaram mas ainda não procederam à sua ratificação. O TPI pode investigar casos de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e também o crime de agressão, quando cometidos ou sofridos por Estados que tenham ratificado o Estatuto de Roma. O Afeganistão é um Estado-membro e, queiram os Estados Unidos ou não, a investigação é legal e legítima. Como está referido no próprio Estatuto de Roma “no decurso deste século (foi redigido em 1998), milhões de crianças, homens e mulheres têm sido vítimas de atrocidades inimagináveis que chocam profundamente a consciência da Humanidade” e é isso que não pode passar sem investigação e, se for o caso, por julgamento e condenações. É uma questão de Direitos Humanos.

Depois da ameaça de Donalp Trump contra os Procuradores do TPI, chegou a solidariedade de Benjamin Netanyahu. O Primeiro-ministro israelita acusa o TPI de estar politizado e obcecado numa caça às bruxas contra os Estados Unidos e Israel, enquanto esquece as violações de Direitos Humanos no Irão. Tal como Trump, Netanyahu também se julga possuído de uma supremacia que o coloca acima da Lei, seja qual for a origem que lhe atribua. Israel também não faz parte do Estatuto de Roma.
Para que fique completo o eixo da nossa preocupação (para não citar directamente George W. Bush) só falta mesmo que Jair Bolsonaro se junte à frente de luta contra o TPI. Sendo que ainda recentemente o TPI aceitou analisar uma denúncia do Partido Democrático Trabalhista, que acusa Bolsonaro de crimes contra a humanidade, devido à conduta face à pandemia do novo coronavírus, talvez não tenhamos de esperar muito.

O TPI é considerado um marco na justiça internacional, mas países como Estados Unidos, Israel, Rússia, China, Índia e Irão continuam de fora. Se o TPI peca por alguma coisa não é certamente pelos eventuais crimes que pretende investigar, mas sim por outros que devia investigar e até agora não o fez. Precisamente por essa falta, alguns países africanos ameaçaram deixar o Estatuto de Roma, considerando que o TPI estava demasiado focado nos crimes cometidos em África e esquecia outros crimes cometidos noutros continentes. Um deles, sem dúvida, é a invasão do Iraque: foi feita com base numa mentira, mas até agora ninguém foi responsabilizado pelas mortes e sofrimento que essa mentira provocou. Desde 2003 que o Iraque mergulhou num caos que ninguém sabe quando poderá terminar.

Pinhal Novo, 14 de Junho de 2020
josé manuel rosendo






quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

Bagdad quase a arder

Foto do assalto à embaixada dos Estados Unidos em Teerão, Novembro de 1979. Autor desconhecido.
Ao olharmos para os acontecimentos por estes dias em Bagdad, é inevitável recordarmos o que se passou há 40 anos em Teerão. No início de Novembro de 1979, após dias de manifestações, a embaixada dos Estados Unidos foi tomada de assalto. Os manifestantes fizeram dezenas de reféns e a crise durou 444 dias. A crise dos reféns, assim ficou conhecida. 

Durante esta crise, os Estados Unidos falharam todas as tentativas diplomáticas para resolver a crise, falharam tentativas militares – pagaram um preço elevado – o Ayatola Khomeini reforçou o poder e Jimmy Carter perdeu a reeleição. A tomada da embaixada norte-americana foi o epílogo de décadas de apoio norte-americano ao Xá Reza Pahlevi. O Xá tinha-se oposto à nacionalização da companhia de petróleos e essa posição fez com que afastasse e prendesse o Primeiro-Ministro. O Xá tornou-se um ditador e a revolução era inevitável.

40 anos depois, em Bagdad, Iraque, a embaixada norte-americana também é o alvo dos protestos. Os manifestantes invadiram o campo da Embaixada situada na supersegura “Zona Verde” da capital iraquiana, vandalizaram zonas de segurança e hastearam bandeiras e cartazes com palavras de ordem hostis aos Estados Unidos. Gritou-se “morte à América!”. O motivo foi a morte de pelo menos 25 combatentes das Brigadas do Hezbollah (Kataib Hezbollah - a versão iraquiana do Partido de Deus) nos bombardeamentos norte-americanos a alvos em território iraquiano. 

Durante o “ataque” à embaixada norte-americana, as forças iraquianas não se opuseram e apenas as Forças de Mobilização Popular (brigadas xiitas fiéis ao Irão) acabaram com o protesto, dando ordem para desmobilizar e dizendo que a mensagem já tinha sido entendida em Washington.

Os Estados Unidos acusam o Irão de estar por detrás do “ataque” à embaixada e Donald Trump disse ao governo iraniano que vai pagar um alto preço de algo de grave acontecer à embaixada ou ao pessoal diplomático; O Irão (que já tinha classificado os bombardeamentos norte-americanos como actos terroristas) respondeu que é preciso ter uma grande “audácia” para matar 25 iraquianos e depois acusar o Irão de ser o responsável pelas manifestações de fúria dos iraquianos. Entretanto, Trump deu ordens para o envio de 750 militares norte-americanos para o Koweit (faz fronteira com o Iraque).

Perante os acontecimentos dos últimos dias, é preciso ter em conta o seguinte:
- Este protesto específico no Iraque relega para segundo plano as manifestações que saem à rua desde 1 de Outubro e em que a classe política é acusada de corrupção. Os manifestantes exigem “a queda do regime”. O país está paralisado.
- No Irão, a situação política interna também é de grande convulsão devido ao aumento do preço dos combustíveis e nas últimas semanas as organizações não governamentais referem cerca de 1.500 mortos.
- Nos Estados Unidos, Donald Trump enfrenta um processo de destituição e tem eleições daqui a menos de um ano. Parece que a todos interessa afastar as atenções sobre o que é realmente importante em termos internos e arranjar o habitual inimigo externo que serve para unir as hostes e fortalecer quem está no poder.

O resultado dificilmente será bom.

Pinhal Novo, 1 de Janeiro de 2019
josé manuel rosendo

sábado, 28 de dezembro de 2019

A segunda vaga da Primavera Árabe

Manifestação no Iraque. Créditos: Prensa Latina


Não é difícil imaginar o aborrecimento para quem anunciou a morte da Primavera Árabe. Para uns era apenas gente que anda sempre aos tiros e à pancada e nunca irá entender-se; para outros, era coisa de gente que vive ainda na Idade Média e por isso nada de bom será de esperar...; para outros ainda, tudo não passou de algo orquestrado do exterior e não teve nada de espontâneo. Lamento, mas não é possível concordar com qualquer destas teses simplistas. Seja como for, este é o momento de recorrer à citação do escritor que utilizou o pseudónimo de Mark Twain: a notícia da minha morte (é) foi manifestamente exagerada. Pois foi! A segunda vaga da Primavera Árabe está aí. Tal como a primeira não se sabe no que vai dar, mas está aí.


Desde logo, dizer que é uma segunda vaga, significa que a origem dos protestos e a fórmula encontrada, são as mesmas: ditaduras ou regimes autocráticos, corrupção, necessidade de mudança, social e política, e de liberdade.O que se passa, neste momento, do Sudão ao Líbano, passando pela Argélia e Iraque, deixa poucos argumentos a quem declarou a morte da Primavera Árabe e pensava que estava tudo a regressar à normalidade, entenda-se o regresso, ou manutenção, do poder político, em mãos que deixam o Ocidente tranquilo quanto ao que daí pode contar.Poderia ser assim, mas não é. A “rua árabe” volta a fazer tremer o poder em vários países. Desta vez já não lhe chamam “revolução facebook”. É uma segunda vaga com as características da primeira? Claro que não, nem poderia ser. Tal como a reacção dos poderes instalados não é aquela que foi protagonizada por Moubarak, Kadhafi ou Bashar Al Assad. 
Foquemo-nos em apenas três países, para umas breves notas de contexto.

 Líbano – a 17 de Outubro, o governo anunciou uma taxa sobre as chamadas através da WhatsApp. Foi a gota de água. Há sempre uma “gota de água” que muitas vezes nem sequer é muito importante. Desde esse dia as manifestações não pararam. Manifestantes acusaram a classe política de corrupção generalizada e levaram à demissão do Primeiro-Ministro Saad Hariri. A “rua” exige uma mudança total da classe política que lidera o país desde o fim da guerra civil (1990). Numa primeira fase o Hezbollah esteve solidário com os protestos, mas depois distanciou-se. Barricadas nas ruas, pneus a arder, escolas e bancos encerrados durante muitos dias, economia a afundar-se. Foi indigitado um novo Primeiro-Ministro (Hassan Diab), um sunita – como tem de ser – mas não tem o apoio do bloco sunita e tem o apoio do Hezbollah e do Amal (partidos xiitas), e também do Movimento Patriótico Livre (partido cristão). No Líbano ouviu-se a palavra de ordem que marcou o início da Primavera Árabe em 2011: “O povo quer a queda do regime!”. 
Argélia – já lá vão dez meses de protestos. Em Fevereiro de 2019, a população saiu à rua depois de Abdelaziz Bouteflika manifestar a intenção de se candidatar a um quinto mandato presidencial. Os militares controlam o poder e foram eles que acabaram por resolver a questão exigindo a partida de Bouteflika. Assim foi, mas a “rua” e o Movimento “Hirak” (sem qualquer estrutura dirigente conhecida) exige o desmantelamento do sistema e a criação de instituições de transição que reformem o sistema político. Um tribunal militar condenou várias pessoas por conspiração (entre elas está um irmão de Bouteflika) e outras por corrupção (entre elas dois antigos primeiros-ministros). A exigência da “rua” mantém-se e aumenta a repressão contra os manifestantes. Instituições europeias e Organizações de Direitos Humanos condenam a reacção das autoridades argelinas.As eleições presidenciais de 12 de Dezembro tiveram cinco candidatos, mas o Movimento Hirak acusou os candidatos de serem meros fantoches do poder instalado e apelou à abstenção. Abdelmadjid Tebboune, um antigo Primeiro-Ministro de Bouteflika, venceu com 58% dos votos, mas a abstenção ultrapassou os 60%. Os manifestantes continuam a sair à rua, principalmente à sexta-feira (mais de 40 consecutivas) e querem uma mudança radical do sistema que dirige a Argélia desde a Independência, em 1962. Falta saber como o Exército argelino vai lidar com tudo isto, sendo que é uma instituição com o crédito de ser a herdeira do Exército de Libertação Nacional que travou a guerra da independência (1954-1962) e deu provas recentes de unidade e resistência a movimentos radicais islâmicos. 
Iraque – Como explicar que num país que “nada” em petróleo, a miséria seja a realidade da maioria da população? Desde 1 de Outubro que, com excepção da zona curda, as manifestações têm saído à rua. Exigem a saída dos actuais dirigentes políticos, um poder que acusam de corrupto e incompetente. A repressão tem sido dura: cerca de 500 mortos e vinte mil feridos. Também no Iraque “o povo exige a queda do regime!” e, tal como no Líbano e na Argélia, não há qualquer liderança organizada dos protestos. O poder xiita não está a conseguir lidar com a situação e foi até numa cidade xiita (Nassíria) que a repressão deixou maior marca. O Irão, aliado do actual poder em Bagdad, está também na mira dos manifestantes. O Iraque tem sido um país à deriva desde 2003: desarticulação das instituições do país (exército, polícia, etc..), depois a ascensão da Al Qaeda e, posteriormente, a presença do Estado Islâmico. Entretanto, as grandes petrolíferas instaladas no país utilizam mão de obra estrangeira deixando apenas tarefas menores para os iraquianos. O preço das sucessivas guerras, o desemprego da maioria dos jovens (60% da população tem menos de 25 anos) e a guerra de bastidores entre Estados Unidos e Irão, conduziram o Iraque a uma situação da qual não se sabe como é possível sair. 
Líbano, Argélia e Iraque, são países em que os ventos da Primavera Árabe de 2011 pouco se fizeram sentir mas onde agora o grito de revolta é semelhante. Houve manifestações, é certo, mas algumas promessas e alterações legislativas foram suficientes para acalmar a “rua”. No Iraque, as preocupações eram outras e as prioridades também. Desta vez o poder político está a braços com protestos que não desarmam. Fartas de miséria e habituadas à violência, as pessoas parecem querer dizer que já nada têm a perder.Líbano (1975-1990) e Argélia (1991-2002) são dois países com memória muito recente de guerras civis que custaram muitos milhares de vidas. São muitos anos de violência que levam a população a reflectir antes de qualquer acto que desestabilize estes países. Apesar disso, os protestos estão na rua, a determinação parece ser grande, e não se sabe como tudo isto vai terminar.


Pinhal Novo, 28 de Dezembro de 2019
josé manuel rosendo

segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Falta saber de onde partiu o ataque à Arábia Saudita. E quem é responsável. Houthis, Irão, Iraque ou...?

Houdeida, cidade portuária no Iémen, voltou a ser bombardeada pela Arábia Saudita após os ataques às instalações petrolíferas sauditas. Foto: jmr, Julho 2019




























Analisar a guerra no Iémen não é fácil e a leitura que aponta para uma guerra entre sunitas e xiitas é absolutamente redutora e não retrata a realidade. Se o conflito já tinha contornos bastante opacos, agora, com o ataque às instalações petrolíferas da Arábia Saudita e com a incerteza quanto à autoria desses ataques, tudo ficou ainda mais difícil.
Nada disto tem uma leitura fácil, no sentido de haver “os bons e os maus” ou de se saber exactamente o que motiva cada acção/movimento num conflito armado. Tem sido sempre assim, mas isso deve obrigar-nos a especiais cuidados na análise e ainda mais nas conclusões. 

Sabemos que os Houthis do Iémen reivindicaram o ataque à Arábia Saudita (como muitos outros que fizeram anteriormente) e disseram que é uma resposta aos constantes bombardeamentos de que são alvo por parte da coligação liderada pela Arábia Saudita.

Esta assunção da responsabilidade por parte dos Houthis parece não agradar à Arábia Saudita e aos Estados Unidos e desde o início que o dedo acusador de Riad e de Washington aponta para Teerão. Ainda foi admitida a possibilidade de o Iraque ter sido ponto de partida do ataque, mas Bagdad negou e não se voltou a falar nisso.

Teerão também rejeita responsabilidade, mas a Arábia Saudita mostrou o que disse ser provas inegáveis do envolvimento do Irão. Segundo Riad, terão sido utilizados 25 drones e mísseis contra as instalações sauditas, incluindo um avião não-tripulado iraniano e mísseis de cruzeiro Ya Ali (construídos no Irão). O Ministério da Defesa saudita disse que o ataque chegou do Norte e foi inquestionavelmente patrocinado pelo Irão. Isto é o que temos: uma convicção e restos de material iraniano.

Para o Secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, existe um consenso no Golfo de que a responsabilidade é do Irão e que o ataque às instalações sauditas foi “um acto de guerra”. É certo que Pompeo também disse que quer uma solução pacífica, mas Washington já decidiu reforçar a sua presença militar na Arábia Saudita. A incerteza e a falta de provas concretas traduzem-se em declarações reproduzidas na comunicação social e atribuídas a altos responsáveis norte-americanos, mas sempre a coberto do anonimato.

Não deixa de ser curioso que depois das acusações ao Irão, a Arábia Saudita tenha bombardeado alvos em Houdeida (cidade portuária no Iémen) com o argumento de que daí partiam ataques com mísseis e drones.

Temos ainda na memória os recentes ataques a petroleiros no Golfo de Omã. O dedo acusador foi inicialmente apontado ao Irão, houve muito burburinho, mas tudo se perdeu na espuma dos dias: de concreto, rigorosamente nada! Houve sim, mais sanções, que os donos do mundo aplicam, sempre que entendem, a seu bel-prazer. E também temos na memória a forma como a Arábia saudita tentou negar responsabilidade no assassínio do jornalista Jamal Khashoggi, até ter de se render às evidências.

A situação criada com o mais recente ataque à Arábia Saudita coloca-nos ainda uma questão incontornável para podermos ter uma noção sobre o que realmente aconteceu: tenha sido a partir do Yémen, do Irão ou do Iraque, como é possível que vários drones tenham voado centenas de quilómetros, sem deixarem rasto/registo, num território que deve ser dos mais vigiados do Mundo?

Será útil recordar que o Bahrein, a menos de cem quilómetros de Abqaiq - um dos locais atacados na Arábia Saudita - alberga a 5ª Frota da Marinha dos Estados Unidos (responsável pela região do Médio Oriente) e alberga também uma base britânica. Na região há também outras bases norte-americanas. Não sendo especialista em Defesa, tenho dificuldade em perceber como é que drones, aviões não-tripulados e mísseis, cruzam este território – um dos mais vigiados do mundo – sem serem detectados. Dizem os entendidos que os drones podem voar quase rente ao solo e por isso difíceis de detectar... E que nem sempre os satélites e os radares estão “apontados” para as zonas que terão sido utilizadas nos ataques. Dizem-me também que até poderão eventualmente ter sido detectados mas num momento em que já não havia tempo para a intercepção. Tudo isso pode ser verdade, e até pode ser que estejam agora a ser revistos os sistemas de vigilância da região para verificar se ficou registada a passagem dos instrumentos utilizados nos ataques. 

Perante situações anteriores em que a credibilidade de alguns protagonistas ficou de rastos, por terem forjado provas, será bom que as eventuais provas encontradas desta vez não deixem qualquer tipo de dúvidas.

Principalmente os Estados Unidos ficam muito mal neste episódio se a passagem dos drones, aviões e mísseis, não foi notada e dela não ficaram registos. 

Ou então teremos de questionar quem terá essa capacidade de utilizar drones, aviões não-tripulados e mísseis, sem deixar qualquer tipo de rasto.

Destes recentes ataques (aos petroleiros e às instalações petrolíferas sauditas) resultam dúvidas que importa esclarecer de forma muito rigorosa, sob pena de ganhar força a teoria de que alguém quer mesmo implicar o Irão e arrastar o mundo para mais uma guerra no Médio Oriente. Sabemos todos quem mais ganha com isso.

No meio deste desassossego, as Nações Unidas enviaram peritos à Arábia Saudita para tentar desvendar o mistério da responsabilidade do ataque. Até que mais alguma coisa se saiba, António Guterres referiu-se à necessidade de “nervos de aço” para evitar uma nova guerra.


Pinhal Novo, 23 de Setembro de 2019

josé manuel rosendo