Para não termos informação apenas de um dos “lados”, convém
ter em atenção a informação que chega de outras origens. Cada um que analise à sua
maneira.
Uma longa carta aberta dos Talibã já deve ter chegado às
mãos do Presidente norte-americano. É um texto, com data de 15 de Agosto, em
que o “Emirado Islâmico do Afeganistão” lembra Donald Trump de que após 16 anos
de guerra, o Afeganistão está pior, os militares norte-americanos continuam a
morrer e o país é governado por políticos corruptos apenas interessados nos
seus próprios negócios.
O texto acusa as lideranças militares de mentirem e de fazerem
chegar informação errada a Donald Trump, relativamente à situação no terreno, e
acrescenta que os afegãos podem contar muito facilmente os caixões que diariamente
são enviados para os Estados Unidos. Quanto aos supostos aliados políticos (governantes
afegãos) dos Estados Unidos são acusados de enviar informação deturpada e de
alguns deles, em simultâneo, estarem envolvidos em negócios com países. É o
caso do General Abdul Rashid Dostum, um homem que já lutou em todas as
barricadas (contra e a favor da União Soviética), fez parte da Aliança do
Norte, esteve várias vezes exilado fora do Afeganistão e é o que habitualmente se
designa por um “senhor da guerra”. Actualmente é Vice-presidente do
Afeganistão. Os Talibã acusam-no de estar a construir uma aliança, fora do
Afeganistão, para combater o Presidente Ashraf Ghani.
Em cerca de duas dezenas de parágrafos, o “Emirado Islâmico
do Afeganistão” (Talibã), Donald Trump é desafiado a não cometer os erros dos
seus antecessores e lembra Trump que os Talibã fizeram aos Estados Unidos o “maior
favor internacional”: livraram os Estados Unidos e o Mundo da “praga comunista”
(alusão à guerra que obrigou a União Soviética, em 1989, a retirar do
Afeganistão). É perante este facto (que os Talibã dizem ter sido um “favor
histórico” aos Estados Unidos) que o “Emirado Islâmico do Afeganistão” pergunta
a Donald Trump se a recompensa é sujeitar os afegãos a serem governados por
políticos criminosos, corruptos, imorais e incompetentes.
Na carta é feita a exigência de que os afegãos sejam
tratados com generosidade, em pé de igualdade com os seus interlocutores, e não
através de invasões e guerras que terminaram sempre com a derrota das potências
invasoras. “Cemitério dos Impérios”, como frequentemente é lembrado, o
Afeganistão já viu caírem por terra as intenções de britânicos, soviéticos e...
os Estados Unidos já perceberam há muito que não vão vencer guerra nenhuma no
país onde inicialmente apoiaram os Talibã contra a União Soviética. Os Talibã
lembram a Donald Trump que não estão a fazer guerra por procuração, dizem que
não recebem qualquer apoio externo e desafiam os Estados Unidos a provar que
isso esteja a acontecer.
A carta termina com um apelo: a juventude norte-americana
não nasceu para morrer nas montanhas e desertos do Afeganistão nem para ir
matar civis num país tão distante dos Estados Unidos; Foi um erro histórico
(dizem) ter enviado a juventude norte-americana para o Afeganistão e um “Presidente
responsável” deve corrigir erros e evitar a morte de militares norte-americanos
no Afeganistão.
Donald Trump é ainda convidado a ficar na história como um
defensor da paz, que não deixa as questões da guerra apenas nas mãos dos militares
que têm interesses próprios para manter essa guerra.
A questão da guerra é colocada de forma muito directa (tradução
livre): “No Afeganistão, cada pai ensina aos filhos a emancipação do país em
relação aos invasores. Num país onde cada criança é criada com um espírito de
vingança e detém a honra histórica de derrotar três impérios antes da invasão
dos Estados Unidos, como conseguirão os norte-americanos uma situação estável
para uma presença permanente? Todos percebem que o principal motor da guerra no
Afeganistão é a ocupação estrangeira”.
Os Talibã lembram a Donald Trump que, após 16 anos, com militares
profissionais e experientes dos Estados Unidos e da NATO, com alta tecnologia e
recursos económicos, não venceu esta guerra; e que também não irá vencer
recorrendo a mercenários. A carta pede ao Presidente norte-americano que analise
a realidade de “coração aberto” e tome decisões responsáveis.
Falta agora saber se haverá resposta de Donald Trump.
NOTAS:
1 - Portugal tem 10 militares integrados na Força NATO (RSM –
Resolute Suport Mission) e 2 militares ao serviço da ONU (United Nations
Assistance Mission in Afghanistan), no Afeganistão; dois militares portugueses
morreram no Afeganistão quando estavam integrados na ISAF (International
Security Assistance Force) - Primeiro-Sargento
Comando João Paulo Roma Pereira (2005) e Soldado Paraquedista Sérgio Miguel
Vidal Oliveira Pedrosa (2007).
2 – Os Estados Unidos anunciaram em Junho o envio de (mais) cerca
de 4 mil soldados para o Afeganistão; desde 2001 morreram no Afeganistão cerca
de 2.400 militares norte-americanos.
Pinhal Novo, 15 de Agosto de 2017
josé manuel rosendo
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