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segunda-feira, 22 de junho de 2020

Verão quente na Palestina?

Faixa de Gaza, 2018. Foto: jmr
O Médio Oriente já tem sofrimento e guerras quanto baste, mas parece que há sempre uma forma de acrescentar problemas. Iémen, Síria e Líbia, são palco de conflitos sangrentos sem fim à vista e com grande potencial para ficarem ainda mais violentos. O cessar-fogo - para concentrar esforços no combate à pandemia - pedido por António Guterres, Secretário-Geral da ONU, foi ignorado. Agora, para além destes três palcos de guerra, corremos o risco de ver “incendiar” a Palestina.

Quando faltam menos de duas semanas – 1 de Julho, a data referida por Benjamin Netanyahu – para que avance a anexação dos colonatos israelitas na Cisjordânia ocupada e do Vale do Jordão, não há qualquer sinal de pressão da comunidade internacional para que Israel recue numa acção unilateral ao arrepio de tudo o que está determinado nos Acordos e Resoluções das Nações Unidas. Será o “plano Trump” a dar os primeiros passos.

Com receio do que pode estar para vir, várias fontes dizem que a Autoridade Palestiniana (AP) já destruiu documentos secretos dos serviços de segurança palestinianos, depois de os digitalizar. A AP receia a repetição do que aconteceu durante a segunda Intifada (2000-2005), quando o Exército israelita entrou nos mesmos serviços de segurança palestinianos e ficou na posse de documentação secreta. Aliás, a AP acusa o Exército israelita de ter entrado em Ramallah (o que Israel nega), sede da AP, durante a semana passada, o que apenas poderia acontecer – segundo os Acordos de Oslo, 1993 – em coordenação com a AP.

O Primeiro-ministro da AP, Mohammed Shtayyeh, avisou que o Verão poderá ser “quente” se Israel avançar com o “plano Trump”. É um teste demasiado importante para que a AP nada faça, sob pena de perder de vez a voz que ainda tem a nível internacional e, mais importante, deixar de contar para os palestinianos que ainda acreditam na resistência e em um Estado palestiniano. A grande questão é a de saber o que poderá a AP fazer, de facto, que possa mudar o rumo que parece estar traçado.

O Hamas apelou à unidade e à resistência. O Movimento Islâmico que controla a Faixa de Gaza, considera que é “dever de cada palestiniano livre combater a agressão” israelita e pediu a união da classe política palestiniana. Os palestinianos - Fatah e Hamas - continuam divididos.

Até agora, o aliado que mais se chegou à AP foi a Jordânia, um dos dois Estados árabes que assinaram Acordos de Paz com Israel. O Rei Abdullah II reiterou oposição ao projecto de anexação e enviou o chefe da diplomacia jordana à AP, em Ramallah. O helicóptero jordano aterrou na Mukata e Ayman Safadi, foi claro: o plano de anexação é uma ameaça sem precedentes para o processo de paz e o Médio Oriente entrará num longo e doloroso conflito.

Ainda não se conhecem pormenores do processo de concretização do “plano Trump”, aceite por Israel e recusado em absoluto pela AP, mas para os que defendem o “grande Israel” este é o momento: uma "oportunidade histórica" para expandir o território e a soberania de Israel, reconheceu Benjamin Netanyahu.
O jornal Israel Hayom (Israel Hoje), considerado um jornal que reflecte a opinião de Netanyahu, admite que o processo possa avançar por fases. Primeiro, a anexação de alguns colonatos, depois o Vale do Jordão. O objectivo será, entre as duas fases, chamar os palestinianos para “negociações de paz”, o que dificilmente acontecerá, e dará argumentos para concretizar a segunda fase e consumar o “plano Trump”. Facto consumado, com a ilusão de que Israel demonstrou vontade para negociar.

O jornal acrescenta ainda que o Primeiro-Ministro israelita não espera que a anexação provoque, da Europa, qualquer resposta punitiva, para além das habituais e indignadas declarações de protesto. Quanto aos países árabes, têm mais em que pensar: Sissi (Egipto) atento à guerra na Líbia; a Arábia Saudita atenta ao Irão e envolvida na guerra no Iémen; Bashar al Assad, ainda envolvido no caos da guerra na Síria; o Líbano em profunda crise política e financeira. Neste contexto, a “causa palestiniana” é também pouco mais do que retórica para os países árabes e Netanyahu não espera danos substanciais nas relações actualmente existentes.

É este o quadro geral de uma situação que ninguém parece ter vontade e/ou capacidade para contrariar. No que diz respeito ao conflito com os palestinianos, Israel atira tudo o que é Direito Internacional para o caixote do lixo e não há uma sanção, um aviso, uma resposta com efeitos concretos, que obrigue Israel a respeitar os Acordos e Resoluções que a comunidade internacional aceita e apoia – e que estiveram na base da criação do próprio Estado de Israel – para que os palestinianos também tenham um Estado, digno e soberano, e não apenas umas bolsas de terreno a que querem chamar Estado.

Esta é uma prova de fogo para a chamada “comunidade internacional”, para as Nações Unidas e também para a Liga Árabe. A ver vamos se, de facto, significam algo em que ainda podemos acreditar, enquanto instituições para o entendimento entre as nações e protecção dos mais fracos face aos mais poderosos, ou se tudo não passa de uma encenação em que os poderosos “podem e mandam” e tudo o resto é faz-de-conta.

A ver vamos como vai ser o Verão na Palestina.

Pinhal Novo, 22 de Junho de 2020
josé manuel rosendo

domingo, 31 de maio de 2020

Nada de bom se avizinha para a Palestina e é pior do que a pandemia...

O "Plano do Século" deixa os territórios palestinianos cercados por território de Israel, com excepção do pequeno troço de fronteira entre a Faixa de Gaza e o Egipto. O mapa faz parte do Plano apresentado a 28 de Janeiro na Casa Branca.

No Médio Oriente quando se diz que as coisas estão mal, a tendência é para que fiquem pior. Raramente não foi assim. Ainda não se sabe o efeito que o novo coronavírus terá nestes países, seja por falta de dados sobre a doença, seja pela fragilidade da maioria dos sistemas de saúde dos países da região. Não há conhecimento real sobre a presença do vírus e sobre os efeitos da pandemia, mas é certo que o poder político em muitos destes países aproveitou os exemplos de confinamento para determinar situações de recolher obrigatório e do chamado “distanciamento social”. Medidas muito a jeito em países que regista(v)am fortes movimentos de protesto.

A pandemia do novo coronavírus é o cenário de fundo em que o mundo se movimenta e, tendo em conta as características dos regimes políticos nesta região do Mundo, vai servir certamente como justificação e/ou cortina de fumo para medidas que reforçam as injustiças sociais e políticas. Desde logo serviu como argumento para formar um governo em Israel (chamam-lhe governo de unidade e de emergência nacional). Aliás, um improvável governo de coligação entre o (de novo) Primeiro-ministro Benjamin Netanyahu (Partido Likud) e o seu actual grande rival Benny Gantz (Partido Azul e Branco), que fez todas as campanhas eleitorais dizendo que era o candidato das mãos limpas, querendo com isso dizer que o adversário tinha as mãos sujas, numa alusão aos processos que Benjamin Netanyahu (Bibi) enfrenta na justiça. Bibi é o primeiro Primeiro-Ministro de Israel, em funções, a responder na justiça.

Num aspecto Bibi e Gantz estão de acordo e, ao que parece, será para ambos o mais importante: a anexação dos colonatos ilegais (à luz do Direito Internacional) na Cisjordânia ocupada, do Vale do Jordão e, acrescento eu, do que mais quiserem quando quiserem. Dia 1 de Julho é a data apontada para início do processo. A chamada comunidade internacional assiste e condena, como sempre. Conhecemos o guião de outras ocasiões. A mesma comunidade internacional há-de conformar-se, como sempre tem feito e aquele que será chamado de novo-normal acabará por ser aceite. Os palestinianos, de momento, pouco podem fazer, “presos” em Gaza ou “debaixo da asa” de uma Autoridade Nacional Palestiniana que perdeu peso político a nível internacional e parece não ter qualquer capacidade de mobilização nem de resistência.

Mas tudo isto só é possível porque existe na Casa Branca um Presidente chamado Donald Trump, que parece ter em Israel – e na anunciada expansão territorial – a única acção que lhe assegure os apoios internos para a reeleição, depois de perdidas todas as outras frentes: Irão, Coreia do Norte, China e... se calhar, até o Afeganistão.

Durante a presidência Trump, os Estados Unidos deixaram de apoiar a UNRWA (Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinianos), cortaram laços com a UNESCO (Agência das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) e agora segue-se a OMS (Organização Mundial da Saúde, também agência da ONU). A juntar a esta ausência voluntária no palco das decisões comuns para o progresso da humanidade, Donald Trump rasgou o “Acordo Nuclear” com o Irão (em que a União Europeia ainda se mantém), abandonou o Tratado Open Skyes (Céu Aberto – em que muitos países europeus continuam) e, até em relação a Cuba, tem estado empenhado num forte retrocesso em relação à aproximação encetada por Barack Obama, mesmo quando na Assembleia-Geral das Nações Unidas têm sido aprovadas sucessivas resoluções para o levantamento do embargo norte-americano à Ilha de Fidel (na última votação, 187 países votaram pelo levantamento do embargo e apenas três votaram contra – Estados Unidos, Israel e Brasil). Conhecendo-se as características das lideranças desta “trindade” é, no mínimo, preocupante. Aliás, no Brasil, nas manifestações de apoio a Jair Bolsonaro é frequente ver um mastro com as bandeiras dos três países. Aqui chegados e para evitar mal-entendidos, convém esclarecer que não estão em causa os povos dos três países, mas sim os actuais líderes políticos.

A Casa Branca de Trump dá passos largos para deixar de ser um parceiro a considerar pela comunidade internacional. É inquestionável que a dimensão e o poderio norte-americano (a vários níveis) são essenciais a uma comunidade internacional forte e credível, mas a aposta de Trump numa ausência cada vez maior nas soluções multilaterais, coloca os Estados Unidos à margem do Direito Internacional e retira-lhes a marca de confiança que é indispensável nas relações internacionais.

Ainda quanto ao Médio Oriente, o corte com a UNRWA, a transferência da Embaixada dos Estados Unidos para Jerusalém e o chamado Plano do Século para o conflito entre Israel e os Palestinianos, hipotecaram o papel de mediador dos Estados Unidos neste conflito. Isto pode significar – e parece que significa – que o conflito (na óptica do actual Governo de Israel e da actual Administração norte-americana) está a chegar ao fim, dispensando mediação. Os dados conhecidos apontam para uma rápida anexação de território palestiniano de modo a estar concretizada antes das eleições norte-americanas, não vá dar-se o caso de Trump perder as eleições. Mas, mesmo que isso aconteça, o putativo candidato presidencial do Partido Democrata, Joe Biden, tem-se revelado muito tímido em relação a este conflito: sobre a Embaixada em Jerusalém disse que está feito e não vale a pena voltar atrás, e sobre a anexação... nem uma palavra. Não é de excluir que diga depois, no caso de ser eleito, o mesmo que disse agora em relação à Embaixada: está feito, não vale a pena voltar atrás. Tem sido essa a estratégia ao longo dos anos: em facto consumado não se mexe.

Pinhal Novo
31 de Maio de 2020

josé manuel rosendo

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

Onde estão os “irmãos” árabes dos Palestinianos?

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Mahmood Abbas, Presidente da Autoridade Palestiniana, na reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas,
em 11 de Fevereiro de 2020. Foto a partir da transmissão da ONU.

Ao ouvir o Presidente da Autoridade Palestiniana, Mahmood Abbas, e o embaixador de Israel Danny Danon, no Conselho de Segurança das Nações Unidas, a minha memória recuperou uma longa conversa com um velho palestiniano. Conversámos num hotel modesto de Jerusalém Oriental, onde ainda se podia fumar, beber café e conversar, sem bandos de turistas barulhentos em redor. Uma daquelas conversas em que temos a sensação de estar a “beber” História. Era um homem da Fatah, antigo professor universitário, laico e, talvez a referência principal que anotei, muito desiludido. Desiludido com tudo. Até com a própria Fatah e com a Autoridade Palestiniana, mas principalmente com os países árabes, alegadamente irmãos.

A voz era pesada. Pesada, porque era grossa e forte, e porque cada palavra tinha um sentido bem pensado e rigoroso. Disse-me ele a propósito da chamada Primavera Árabe – que considerava inevitável – que os líderes árabes, de tão corruptos e inseguros que alguns são, apenas se preocupavam com o seu próprio poder. Nada mais lhes preenchia a agenda, embora a retórica sobre a causa palestiniana incluísse palavras bonitas. A solidariedade ficava por aí, pelas palavras, e por despejar alguns milhões de dólares nos bolsos da Autoridade Palestiniana, que, dizia-me ele, estava, tal como os líderes árabes, preocupada apenas com o próprio poder.

Este homem contou-me também – para explicar a espontaneidade das revoltas árabes de 2011 – que a primeira Intifada (1987) começou da mesma maneira que as ruas do Cairo se “incendiaram”: sem direcção ou intervenção das forças políticas palestinianas. Os líderes foram surpreendidos pela revolta popular e limitaram-se a apanhar, e depois dirigir, essa revolta.

A reunião de terça-feira no Conselho de Segurança da ONU trouxe-me de volta a memória desta conversa, quando o embaixador de Israel na ONU, Danny Danon, “atirou à cara” de Mahmood Abbas a atitude de líderes árabes que assinaram Tratados de Paz com Israel. Foi o caso do antigo presidente egípcio, Anwar Sadat, e do Rei Hussein, da Jordânia. Com os exemplos dados, o diplomata israelita passou uma mensagem muito clara: os palestinianos estão sozinhos, não esperem ajuda dos vossos amigos árabes. E tem razão. É longa a história de desentendimentos entre os países árabes quando se trata de objectivos comuns. Cada um trata de si. O funcionamento e o impacto quase nulo das decisões da própria Liga Árabe, é um exemplo dessa forma de estar. O actual momento do conflito israelo-palestiniano seria o ideal para os países árabes falarem a uma só voz. Falar e fazer algo de concreto.

Tudo isto não anula a validade dos argumentos de Moahmood Abbas perante o Conselho de Segurança. Abbas rejeita o plano de Donald Trump e contrapõe a exigência de haver primeiro uma solução política, e depois pode haver ajuda económica, que até será bem-vinda. Ao contrário é que não!
Perguntou ainda Abbas quem pode oferecer Jerusalém como se fosse um presente (alusão ao reconhecimento feito pelos Estados Unidos de Jerusalém como capital indivisível de Israel)? Volta a ter razão, mas esqueceu-se que até estava sentado à sua frente, no Conselho de Segurança, o representante do mesmo Reino Unido que ofereceu – Declaração Balfour -  um Lar Nacional para o Povo Judeu, num território que não pertencia ao Reino Unido. Ou seja: Trump “oferece” o que não lhe pertence, tal como o Reino Unido fez, já lá vai um século.

Mahmood Abbas está carregado de razão, no que ao Plano de Donald Trump diz respeito, mas esquece-se que tem sido com a actual Autoridade Palestiniana que as aspirações palestinianas têm vindo a ser sucessivamente eliminadas. Seja por culpa própria – desmobilização da sociedade palestiniana em torno das reivindicações nacionais – seja porque a nível internacional a causa palestiniana apenas tem apoio retórico, notando-se neste plano a falta de qualquer acção concertada por parte dos países árabes “irmãos”.

Em termos muito pragmáticos a realidade no terreno é fácil de definir: na Faixa de Gaza, controlada pelo Hamas, não há uma única bota israelita; na Cisjordânia, controlada pela Autoridade Palestiniana, a realidade do território é aquela que consta do mapa exibido por Mahmood Abbas no Conselho de Segurança da ONU. E não, que não se acuse esta leitura de ser pró-Hamas, ou pró-terrorismo ou pró-outra-coisa-qualquer que, dá para adivinhar, é o primeiro argumento a sair da cartola. Não é nada disso. É apenas olhar para a realidade no terreno e ler o que têm sido as mais recentes décadas com a causa palestiniana sempre a perder terreno. O Estado da Palestina, se nada mudar, poderá quanto muito resumir-se a umas bolsas de terreno dentro do Estado de Israel.

Pinhal Novo, 12 de Fevereiro de 2020
josé manuel rosendo


sábado, 21 de julho de 2018

A impossibilidade prática de dois Estados na antiga Palestina (I)


                           Hebron, foto: jmr, Dezembro de 2017

A carta do Secretário britânico dos Assuntos Estrangeiros, Arthur James Balfour, com data de 2 de Novembro de 1917 e endereçada ao Barão Rothschild, líder da comunidade judaica do Reino Unido, referia a intenção do governo britânico para facilitar o estabelecimento do “Lar Nacional Judeu” na Palestina. Tudo começou aí, sendo que em finais do século XIX Theodore Herzl já tinha escrito “O Estado Judeu”, dando uma base ideológica ao Sionismo. Seguiu-se a resolução da Assembleia Geral da ONU (“Plano de Partilha”) aprovada em 1947. Dessa resolução apenas a parte correspondente à criação do Estado de Israel foi cumprida. A outra metade, o Estado da Palestina, não passou do papel.

Não é o momento para recuperar toda a história de 70 anos de conflito, mas cada passo que tem sido dado sempre foi no sentido oposto ao do previsto para a criação de um Estado da Palestina. Desde logo com a ocupação dos territórios palestinianos em 1967 (na sequência da Guerra dos Seis Dias) e com a posterior consolidação da ocupação através da construção de colonatos. A construção do Muro de Separação (iniciada por Ariel Sharon – um “falcão” - mas que foi uma proposta de Ehud Barak - trabalhista/socialista), a constante anexação de terras palestinianas e o último episódio da transferência da embaixada dos Estados Unidos de Telavive para Jerusalém, são sinais de que nada foi feito na direcção pretendida pelos palestinianos. Antes pelo contrário.

Talvez o momento dos Acordos de Oslo, assinados há quase 25 anos, entre Yitzhak Rabin e Yasser Arafat, tenha sido o único momento em que foi possível vislumbrar uma solução (mesmo que Arafat tenha reconhecido o Estado de Israel e Rabin tenha ficado por apenas reconhecer a OLP como interlocutora e representante do povo palestiniano), mas ainda assim – basta lembrar as críticas de que o próprio Arafat foi alvo, tal como Rabin (mais tarde assassinado por um extremista judeu) – as questões que ficaram por resolver nunca foram resolvidas. As fronteiras de um Estado palestiniano, a retirada dos colonos dos territórios ocupados – com excepção da retirada da Faixa de Gaza em 2005 – o estatuto de Jerusalém, o direito de retorno dos refugiados palestinianos e o controlo da água na Cisjordânia, são questões deixadas em aberto nos Acordos de Oslo e que as negociações que se seguiram nunca conseguiram resolver. É certo que Oslo permitiu a criação da Autoridade Palestiniana, mas de que vale essa conquista se a Autoridade pouca autoridade tem? É certo que a Autoridade Palestiniana tem obtido algumas vitórias diplomáticas e reconhecimento internacional, mas de que vale isso se, na Palestina, é o Governo de Israel quem manda?

Pensar que 70 anos depois da aprovação da resolução 181 da Assembleia Geral da ONU ainda é possível criar um Estado palestiniano, não é pura utopia, é tão só uma impossibilidade prática. Basta andar pela Cisjordânia e olhar para o topo das colinas e dos montes: lá está um colonato israelita. Ilegal, à luz do Direito Internacional, mas está lá. E sempre em expansão. E a juntar aos colonatos estão as estradas interditas aos palestinianos; está a presença militar de Israel para garantir a segurança dos colonos; estão os postos de controlo; estão as fronteiras controladas por Israel. 

Na Cisjordânia ocupada, dividida em três tipos de áreas (Zonas A, B e C), a Autoridade Palestiniana tem autoridade plena (zona A) numa escassa parcela do território. Cerca de 2.500.000 palestinianos vivem num Cisjordânia com cerca de 6.000 quilómetros quadrados. Na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental existem cerca de 400 colonatos onde vivem mais de meio milhão de israelitas. O que se vê na Cisjordânia ocupada e em Jerusalém Oriental é um constante avanço do território ocupado por Israel e um recuo permanente dos territórios onde vivem os palestinianos. Pensar que é possível construir um Estado palestiniano num território ocupado por 400 “ilhas”, respectivos acessos e aparelho militar, apenas pode significar a recusa de ver o óbvio: não é possível! A não ser que passemos a designar por Estado uma Instituição num território em que apenas tem uma autoridade administrativa, dispensando o controlo de fronteiras, a existência de um exército e até a ausência de moeda própria. Isto é, se não se alterar a realidade no terreno, os palestinianos nunca terão direito a um Estado soberano.

Um dia destes, Donald Trump ou um outro Trump, poderá vir dizer em relação à Cisjordânia o que Trump disse agora em relação a Jerusalém: “Hoje reconhecemos o óbvio. Que Jerusalém é a capital de Israel. Isto é apenas o reconhecimento de uma realidade”.

Pinhal Novo, 21 de Julho de 2018
josé manuel rosendo