domingo, 25 de setembro de 2016

Deixem de brincar com a Síria


Sabendo o que se está a passar na Síria, é absolutamente desesperante ouvir as declarações dos principais responsáveis políticos, principalmente os das grandes potências. Os despachos das agências internacionais dão conta de sucessivos bombardeamentos em Aleppo e acrescentam constantes actualizações do número de mortos e infraestruturas destruídas. Estas notícias surgem intercaladas com as declarações políticas: John Kerry, Secretário de Estado norte-americano, a dizer que “o cessar-fogo não morreu”; Serguei Lavrov, Ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, a dizer que o cessar-fogo “não tem razão de ser” se a oposição moderada não se demarcar dos grupos “terroristas”. Isto é algo esquizofrénico. E muito hipócrita.

John Kerry sabe perfeitamente que o cessar-fogo está morto e enterrado (para não falar das centenas de violações durante a semana em que esteve em vigor…) e não adianta fazer que não vê o que se passa em Aleppo e em muitos outros locais na Síria; Serguei Lavrov, antes de assinar o acordo de cessar-fogo, sabia perfeitamente que não iria acontecer a separação de grupos armados que agora vem exigir. Lavrov sabe que é mais fácil virar um acordo de pernas-para-o-ar do que separar grupos que combatem lado-a-lado numa guerra civil fratricida e só porque a Rússia acha que sim. 

Muitas negociações que decorreram em Genebra terminaram no momento em que os negociadores não conseguiram chegar a acordo sobre uma lista de grupos terroristas. Kerry e Lavrov dizem ambos que é importante preservar o acordo que assinaram a 9 de Setembro, mas sabem que a realidade já rasgou esse acordo e que se ele serviu para alguma coisa foi apenas para os combatentes terem uns dias de descanso, para o exército sírio se reorganizar e para haver uma pequena pausa na contagem dos mortos (que ainda assim continuou).

Sabemos que a hipocrisia é a dama a que nenhum diplomata consegue recusar um passo de dança, mas este salão está cheio de cadáveres e já era tempo de mandar a orquestra ficar em silêncio.

Como se não bastasse este cinismo das grandes potências, o Presidente sírio Bashar al Assad deu uma entrevista à Associated Press na qual diz que está para ficar, assumindo que a guerra está para durar e o embaixador sírio nas Nações Unidas foi muito claro ao dizer que em Outubro não haverá negociações. Setembro está a chegar ao fim.

A cereja no topo do bolo veio do presidente turco, que acusou os Estados Unidos de terem enviado dois aviões com armamento para os combatentes curdos no norte da Síria. A Turquia considera estes curdos terroristas; para os Estados Unidos são aliados. Turquia e Estados Unidos combatem o Estado Islâmico, fazem parte da mesma coligação que bombardeia o califado – e da NATO – mas escolhem amizades diferentes.

Quando será que alguém vai parar a carnificina e o que vai fazer a justiça internacional quando o banho de sangue terminar?

Nota: os créditos da foto que ilustra este escrito são de Ryad Alhussen (tirada na tarde de 24 de Setembro) e escolhi-a por constituir uma imagem que pode acordar consciências. Não há guerras sem mortos.

Pinhal Novo, 24 de Setembro de 2016

josé manuel rosendo

2 comentários:

  1. o horror ao mais alto (ou baixo) nível, ninguém está a brincar com a Síria, estão a jogar muito a sério os seus interesses geoestratégicos tendo como tearro de operações a Síria para a qual se estão manifestamente c...

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  2. Sinceramente, se eu fosse da síria queria mesmo vingar. Se me matassem um filho ia-me resignar..... claro que não...

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